Folha de São Paulo
Do nome ao cenário, o encontro "Seleção Caixa: em campo pelo Brasil", será repleto de alusões à Copa do Mundo, cuja próxima edição, na Rússia, começa em 14 de junho. Celebridades da bola, como ex-jogador Cafu e o narrador Galvão Bueno, foram convidadas para dar palestras motivacionais aos gerentes. Completa o time a badalada expert em tecnologia digital Martha Gabriel.
Os mestres de cerimônia serão o ator Luigi Barricelli, astro de novelas globais, e a apresentadora Renata Fan, do Programa Jogo Aberto, da Band.
A Caixa mantém em sigilo os custos do evento, bem como os valores dos cachês pagos aos convidados. Num site de agenciamento de palestras, por exemplo, o passe de Cafu está cotado a R$ 40 mil.
A Folha apurou que o contrato com Galvão Bueno ainda não havia sido assinado nesta quarta-feira (9). A condição para que ele participasse era a de que não fossem permitidas filmagens e fotografias. A ideia dos organizadores era que a presença do narrador fosse uma surpresa para os funcionários.
O propósito do investimento na "Seleção Caixa", segundo o banco, é divulgar suas "novas e desafiadoras metas" para 2018, entre as quais superar o lucro de R$ 8,6 bilhões em 2017.
O MPF (Ministério Público Federal), que conduz inquéritos sobre pagamento de propinas a políticos, em troca de investimentos bilionários, cobra desde dezembro melhorias de gestão para blindar o banco da ingerência de partidos.
Mesmo após o afastamento de vice-presidentes investigados, a maioria das diretorias é composta por indicações políticas.
Ao fim das atividades no Mané Garrincha, os funcionários da Caixa vão pular com o cantor Saulo, ex-banda Eva, que entoa hits como "Nada lhe é Proibido", "Não Precisa Mudar" e "Não me Conte seus Problemas". O público foi selecionado nas unidades do banco em todos os estados e embarcará, na semana que vem, em ônibus e aviões.
O presidente Michel Temer -- que tem apostado na instituição para estimular a economia -- também foi chamado, mas ainda não confirmou presença. Ele e aliados foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República por integrar uma organização criminosa que desviava recursos de vários órgãos públicos, incluindo a Caixa. A acusação contra o presidente foi barrada pela Câmara e só poderá prosseguir quando ele deixar o cargo.
Palco do evento da Caixa, o Mané Garrincha foi o estádio mais caro da Copa e, atualmente, está subutilizado, tendo em vista que a capital federal não tem grandes clubes de futebol e nem um fluxo de eventos que garanta ocupação frequente.
A ociosidade é tanta que, para fisgar o cliente e assegurar investimentos dos gerentes da Caixa na economia local, o governo do DF deu um desconto de 85% no valor do aluguel do estádio, que caiu para R$ 48 mil.A obra foi contratada por R$ 696 milhões, mas, ao final, custou mais que o dobro, R$ 1,577 bilhão.
Procurada pela Folha, a Caixa informou que o orçamento não está finalizado. Em nota, alegou que o valor deve ficar "bem abaixo" de R$ 25 milhões.
O banco disse que "os contratos com as personalidades participantes têm cláusula de confidencialidade". Sobre os custos com passagens, diárias e hospedagens, também justificou que o orçamento não está concluído.
O banco alegou que o evento "será uma boa oportunidade para o comando da Caixa motivar e valorizar os seus gestores".
"A Caixa está seguindo a iniciativa de outros grandes bancos brasileiros, que também promoveram eventos da mesma magnitude voltados para a implementação de suas ações em 2018. Entre eles, o Banco do Brasil, que, em março passado reuniu 7.000 empregados no estádio do Palmeiras, em São Paulo", afirmou.
No mesmo dia do evento no Estádio Mané Garrincha, o Conselho Curador do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) se reúne e pode decidir pela liberação de recursos para expansão do crédito imobiliário da Caixa.
O banco é uma das apostas do presidente Michel Temer para estimular a economia brasileira, através do aumento de financiamentos habitacionais em ano eleitoral.
Esse objetivo esbarra na necessidade de a Caixa manter a sua adequação aos níveis de capital próprio exigidos internacionalmente para se fazer empréstimos. A regra se tornará mais rígida a partir do ano que vem.
Apesar de ter tido um lucro líquido recorde de R$ 8,6 bilhões no ano passado, e ter se enquadrado com folga nas novas normas após um período de aperto, a avaliação de especialistas é que o banco não pode se dar ao luxo de exagerar nos empréstimos.
"A Caixa é um banco de políticas públicas, mas esse é um momento em que não pode acelerar muito a sua carteira de crédito", afirma o economista João Salles, da consultoria Lopes Filho.
Uma proposta em estudo, que pode ser decidida no dia 16, é a liberação de recursos do FGTS para ampliar o lançamento de unidades das faixas 1 a 1,5 do Minha Casa, Minha Vida.
São exatamente as faixas do programa habitacional com maior risco de inadimplência que requerem o maior nível de cobertura por parte do banco.
A faixa 1 é direcionada a famílias com renda de até R$ 1.800 mensais, e a 1,5 para renda de até R$ 2,6 mil.
Como divulgou a Folha, pessoas que participam das discussões entre a Caixa e o FGTS afirmam que o governo quer usar pelo menos R$ 3 bilhões do fundo para retomar os lançamentos do programa habitacional.
Outra possibilidade seria usar, nessa expansão do crédito, os dividendos que a Caixa deixou de pagar ao seu controlador, a União.
Neste ano, o banco quitou apenas os 25% mínimos de dividendos relativos a 2017, requeridos em contrato.