por Helder Lima, da RBA
São Paulo – A reforma previdenciária que o governo interino de Michel Temer quer emplacar no país poderá ter um impacto recessivo na economia se for levada a cabo a ideia de desvincular do salário mínimo o valor das aposentadorias, pensões e outros benefícios. Sem a política de valorização real definida pelos governos Lula e Dilma, que deve seguir até 2023, os segmentos da sociedade que dependem da Previdência vão receber os benefícios corrigidos apenas pela inflação.
A economia dos municípios também será afetada com essa mudança, como mostrou nesta quinta-feira (19) o vice-presidente de assuntos da seguridade social da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), Décio Bruno Lopes, em seminário promovido em São Paulo pela CTB. Segundo dados que ele apresentou aos trabalhadores e sindicalistas, dos 5.566 municípios brasileiros, em 82% deles (4.589) os pagamentos aos aposentados do INSS superam a arrecadação municipal. E em 70% deles, os recursos oriundos da Previdência superam os repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
"Todos os economistas dizem que a Previdência precisa de reforma. O assunto está na pauta de todos os governos, independentemente de quem está no governo. Mas a Previdência precisa de políticas de Estado e não de políticas de governo", afirmou Lopes, ao defender que a legislação da Previdência seja perene para que se saiba o que vai acontecer no futuro.
Para o representante da Anfip, deveria ser fundamental na reforma rever a questão das renúncias previdenciárias, em vez de cortar a vinculação ao salário mínimo. Ainda segundo os números que ele apresentou, essas renúncias foram de R$ 65,4 bilhões em 2015, e este ano devem ser de R$ 55,1 bilhões. Ainda que haja um recuo em relação ao ano passado, as renúncias projetadas para 2016 devem significar 15% do total arrecadado, de R$ 366 bilhões.
Desde os anos 1990, o país passou por pelo menos seis reformas previdenciárias. A mais lembrada é a de 1999, do governo de Fernando Henrique Cardoso, que instituiu o fator previdenciário, uma regra para reduzir o benefício de quem se aposenta antes dos 65 anos. A presidenta do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Jane Lucia Wilhelm Berwanger, afirmou que "reforma toda hora causa um estresse social grande, as pessoas entram em pânico, isso é ruim porque causa instabilidade". Jane destacou que essa vocação para mudança também influi no custeio da previdência. "Tem gente que acaba não recolhendo a contribuição, as pessoas não querem aplicar o dinheiro ali."
"Querem levar o sistema previdenciário à bancarrota para vender benefício privado", disse o advogado previdenciário Daisson Portanova sobre a reforma pretendida por Temer. Segundo ele, o ato do presidente interino de passar a estrutura da Previdência para o ministério da Fazenda, que agora é capitaneada pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, tem uma lógica que é fazer com que tudo vire dinheiro da Fazenda. "Se tivesse um ministro próprio era melhor; o problema é que querem continuar desonerando os empresários", afirmou.
Ele também disse que o dinheiro da Previdência vem sendo sistematicamente usado pelo governo por meio das Desvinculação de Receitas da União (DRU), o que somado às desonerações caracteriza um estelionato previdenciário. "Somos tungados dia a dia e não estamos percebendo isso."
Outro ponto polêmico na pretensa reforma da Previdência é a sinalização do governo, repetindo a postura de Dilma Rousseff nesse caso, em favor da adoção de uma idade mínima. "Idade mínima de aposentadoria é um fator importante, a maior parte dos países já tem", disse na quarta-feira (18) o ministro da Fazenda. Ele não arrisca por enquanto dizer qual seria essa idade, nem como seriam as regras de transição. Mas de qualquer modo os previdenciaristas avaliam que a medida vai fazer com que as pessoas contribuam por mais tempo. "Estão querendo dar o golpe de novo", afirma Daisson Portanova, para quem a reforma fragiliza direitos, não preserva direitos em formação, reduz o bem-estar social e diminui a inserção social.
"A ideia de 65 anos é um bode na sala para conseguir algo como 60 anos", afirma Jane Lucia. A presidenta do IBDP também acredita que o trabalhador será prejudicado, principalmente porque a experiência tem mostrado que a partir dos 52 anos a média de rendimento do trabalhador cai, "porque se ele perde o emprego, tem de procura outro e não tem mais a mesma renda do emprego anterior". Se a média de renda cai, como ele vai continuar contribuindo por mais tempo, indaga. Ela acredita que haverá uma regra de transição para atenuar os efeitos da medida, criticada também por tratar todo o país, sem levar em conta suas diferenças regionais, com diferentes expectativas de vida.