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4 de Setembro de 2020 às 06:17

Reforma administrativa de Bolsonaro demoniza servidor, mantém privilégios e facilita privatizações


RBA
Eduardo Maretti

São Paulo – A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa encaminhada ao Congresso pelo governo Jair Bolsonaro, nesta quinta-feira (3), em nada impacta os rendimentos e a carreira de parlamentares, ministros de tribunais superiores, promotores, juízes e militares. O economista Amir Khair, que foi secretário municipal de Finanças de São Paulo na gestão de Luiza Erundina, defende que haja uma discussão ampla sobre o que deve ocorrer em relação ao serviço público e o aprofundamento do debate.

Esse debate, diz Amir, deveria ser amplamente levado à sociedade, que é quem, em última análise, vai sofrer os impactos da reforma, como no caso da reforma da Previdência. Para o economista, porém, essa discussão profunda não vai ocorrer, porque o ritmo que se impõe no Congresso “é burocrático, para não deixar haver discussão”.

“Não é todo mundo igual. Não só na escala salarial, como também no tipo de trabalho. Não vejo necessidade alguma de reduzir funcionários nas áreas carentes. E as áreas carentes são educação, saúde etc.”, diz.

“Por outro lado, é preciso que não haja tantos funcionários na área burocrática e nem se permitam tantos cargos de confiança como hoje”, continua. Segundo Khair, a situação chega a ser esdrúxula. “Por exemplo, se você vê a folha de pagamento de servidores e localiza onde estão fisicamente, leva um choque. Funcionários do Executivo são emprestados para cá e para lá, inclusive para o Legislativo. É impressionante.”

Demonização do servidor

A reforma de Paulo Guedes não pretende modernizar e reorganizar o serviço público brasileiro, mas vai no sentido que tem orientado as reformas no país desde o governo Michel Temer. Os princípios são os da demonização do servidor e da diminuição do Estado, de maneira generalizada. “Sem dúvida”, constata Khair.

“Mas estão fazendo isso com o Estado não só nessa reforma, como em todas.  Principalmente a que mais sacrificou o povo, a reforma da Previdência, que tira 100 bilhões de reais por ano (do sistema previdenciário). O que pega inclusive quem ganha até dois ou três salários mínimos.”

Em relação à reforma administrativa, para o economista, a enorme quantidade de dinheiro destinada à burocracia deveria ir pra “funções-fim”. “Para melhorar salário de professores, profissionais da saúde, assistência social e outros. A turma que se sacrifica, que põe a mão na massa e é sempre cobrada.”

Na mídia tradicional, analistas afirmam considerar a proposta como importante para o “equilíbrio das contas públicas”, mas alguns ressalvem que ainda não é o “ideal”. Isso porque, afirmam, esse resultado só virá a longo prazo, dado que a PEC não atinge os atuais servidores, só os que vierem a ser contratados. Redução do salário inicial e flexibilização da estabilidade no emprego só devem ser aplicadas em futuras contratações. Para estes comentaristas, a reforma “sinaliza” positivamente ao mercado, mas o “enxugamento” do Estado deveria ser mais rápido.

Estabilidade ameaçada

A PEC prevê que servidores concursados com contratos de duração indeterminada não terão mais estabilidade e poderão ser demitidos. Por exemplo, se o governo necessitar promover cortes de gastos.

Em postagem nas redes sociais, o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) afirmou que a PEC do governo “pretende redefinir as carreiras e os direitos do servidor público brasileiro”. “É uma vergonha. A primeira declaração de Bolsonaro é a seguinte: militares, juízes, promotores e parlamentares estão fora (da reforma). Aqueles que têm privilégios, salários e pensões, milionários”, disse. Segundo ele, as distorções do serviço público estão justamente no Judiciário, no Ministério Público, entre servidores do Legislativo e  militares.

“Ele quer atingir o servidor que ganha mil, 2 mil, 3 mil, (o trabalhador) das universidades, que dá a vida para garantir atendimento à população na educação, na saúde, na agricultura. São esses que quer perseguir”, questiona o parlamentar. “É covarde!”, protesta.

Reforma de Estado

Para Fausto Augusto Júnior, diretor técnico do Dieese,  a reforma administrativa pode ser, na prática, uma “reforma de Estado”.  Em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual, ele destacou que a proposta “deve avançar para cima de uma parte importante do patrimônio público de todos os brasileiros”.

A ideia do governo seria a de que, com o enfraquecimento do setor público e das estatais, as privatizações sejam facilitadas.  “Então, de certo modo, ele vai entregar boa parte das nossas empresas. Ou de um jeito efetivo, ou em pedaços, como está fazendo com a Petrobras, em especial para os grupos internacionais”, observa.

Embora o governo argumente que as novas regras irão abarcar apenas os novos servidores, Fausto avalia que, “a proposta vai acabar atingindo todo mundo”. Isso porque a PEC prevê o fim do Regime Jurídico Único, que garante a estabilidade dos servidores. A medida, para o diretor do Dieese, deve paulatinamente diminuir o número de trabalhadores estáveis e estatutários promovidos por concurso público. “E eles vão passar a ingressar (no serviço público) por meio da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que está em desconstrução por esse próprio governo”, conclui.

Com colaboração de Clara Assunção


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