RBA
Eduardo Maretti
Nas últimas semanas, têm se intensificado as informações de que a fuga de investidores estrangeiros em aplicações de risco no Brasil não para de crescer. A tendência contraria o otimismo em relaçaõ à política econômica que “tentam vender” ao mercado local o governo de Jair Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes. Na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, por exemplo, o presidente afirmou que os investimentos no país demonstram “a confiança do mundo em nosso governo”.
As perspectivas para 2020 são de que as aplicações “de risco” devem registrar fuga de capitais maior que o dobro na comparação com 2019, chegando ao fim do ano com balanço negativo de US$ 24 bilhões, ou R$ 135 bilhões, contra as saídas de US$ 11,1 bilhões (R$ 62 bilhões) no ano passado, segundo matéria da Folha de S. Pauloa partir de informações do Institute of International Finance (IFF), instituição que reúne 450 bancos e fundos de investimento de 70 países.
Paulo Guedes irrealista
Para o economista Marco Antônio Rocha, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), para além das questões propriamente de mercado, uma das principais causas dessa debandada de investidores é política. “O governo mostra estar completamente sem rumo. As declarações do ministro Paulo Guedes são equivocadas e desprovidas de realismo e criam incertezas quanto à gestão da economia”, diz.
Segundo avaliações dos chamados agentes de mercado, da mídia e do governo, o país tem dificuldade para lidar com seu balanço fiscal em relação às contas públicas, o que justificaria a manutenção das amarras aos gastos públicos impostas pelo teto de gastos, introduzido pela Emenda Constitucional 95.
“As incertezas dos investidores não são geradas pelo risco fiscal. Há um certo terrorismo da mídia e do governo no sentido de que o centro do problema está aí. Mas o problema está no próprio governo e suas tentativas de manter uma regra fiscal inexequível. É essa insistência que cria a incerteza em relação à economia brasileira. O mercado está começando a ler isso.”‘
Claro que há fatores externos conjugados com o “irrealismo” do governo e de Guedes, como a “aversão” a risco pelos investidores, relacionada às incertezas da conjuntura internacional potencializadas pela pandemia de coronavírus. Esse quadro provoca desvalorização das moedas periféricas de modo geral, como o real. “O que provoca fuga de capitais? É o mercado achar que não vai ter rendimento num lugar ou que o risco de operar não tem remuneração adequada.”
Segundo informações da CNN Brasil, a moeda brasileira é a terceira que mais perdeu valor (28,5%) frente ao dólar desde o início de 2020. Em uma lista com 121 países, o real só não desvalorizou mais que a moeda da Zâmbia (29,8%) e da Venezuela (cerca de 90%).
O continuado comportamento errático do governo e de Paulo Guedes é visível. Por exemplo, para criar o chamado Renda Cidadã, para o qual não sabe de onde tirar dinheiro sem “furar’ o teto de gastos, o governo já disse que estudava o calote em precatórios, e, esta semana, lançou a ideia de extinguir a declaração simplificada do Imposto de Renda.
Mais do que isso, segundo O Estado de S. Paulo, uma das propostas é “endurecer” as regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência e baixa renda, abono salarial e Bolsa Família, e outras medidas, igualmente polêmicas.
Sem saber como criar o financiamento do Renda Cidadã, com que pretende substituir o Bolsa Família e criar sua própria “marca”, o governo Bolsonaro atira para todo lado, com balões de ensaio ou não. “O teto de gastos limita o espaço do Estado e exacerba o conflito distributivo de tal forma que fica muito difícil desenhar políticas com um mínimo de racionalidade”, diz Marco Antônio Rocha.
Não é à toa que Paulo Guedes ora está na corda bamba, ora “é o cara”, como às vezes diz o próprio Bolsonaro. “Tudo isso também fomenta um grau de incerteza quanto ao planejamento da política pública e os rumos da economia. Começa a haver desconfiança de que o teto é exequível no curto e médio prazo, e ninguém sabe o que vai acontecer.”
Muitas pessoas se perguntam: se o capital especulativo não produz emprego e renda, qual a importância da “fuga de investidores” do país? O relevante não é o que esse capital produz, explica o professor da Unicamp, já que os benefícios desse capital são mínimos. Mas os efeitos da volatilidade que esses fluxos geram no câmbio são muito negativos para a economia do país.
“Afeta a vidas das empresas e das famílias, porque cria incertezas sobre insumos importantes. Por exemplo, o preço das commodities, impactos no IGPM, que vai influenciar os aluguéis, as tarifas públicas, o preço dos alimentos.”
Para Rocha, o fluxo desses capitais deveria ser melhor regulamentado, sobretudo as saídas de capital, para não terem a liberdade de movimentação que gera tamanha volatilidade cambial.