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1 de Dezembro de 2016 às 09:38

Na CUT, Dilma destaca a importância da democracia nas relações de gênero

Para ela, a lógica do privilégio, a violência e os direitos em risco com a PEC 55 e a terceirização – típicas da volta do Estado de exceção – afetam mais as mulheres, em especial pobres e negras


Crédito: © NELSON ANTOINE/FRAMEPHOTO/FOLHAPRESS
Dilma Rousseff, no ato político Mulheres Construindo História, Desde 1986, na sede da CUT

por Cida de Oliveira, da RBA

São Paulo – Em noite de celebração pelos 30 anos de Políticas para Mulheres na CUT, que reuniu lideranças que ajudaram a criar e a fortalecer a igualdade de gênero na central em todos esses anos, a ex-presidenta Dilma Rousseff falou de flores. E, com ternura até, tocou fundo em algo que parecia ter sido enterrado nessas três décadas que coincidem com o período de redemocratização do país, mas ressurge com força especialmente a partir do golpe: o autoritarismo.

"Causam impacto rever certas coisas que pareciam enterradas, como as bombas de gás lacrimogêneo atiradas pela polícia sobre companheiros e estudantes, que se manifestavam contra a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 55, anteontem, em Brasília. É o estado de exceção ressurgindo descarado, aberto e sem pudor. Isso compromete a democracia e é o retorno da política neoliberal enterrada nas urnas, por meio da medida que congela os gastos", disse.

Ela destacou a absolvição pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) de duas pessoas condenadas em primeira instância pelo juiz federal Sérgio Moro, no julgamento de executivos da construtora OAS investigados no âmbito da Operação Lava Jato.

“Isso é grave porque afeta a democracia. E o que afeta a democracia afeta a mulher. Às mulheres interessa a democracia e todos os espaços democráticos, tudo o que se refere à vida em sociedade", afirmou. "É como a perseguição desmedida a homens e mulheres transformados em inimigos pelo Estado. Esse governo ilegítimo considera como inimigos os movimentos de ocupação das escolas e espaços públicos contra a PEC, mas não considera inimigos aqueles que entram no Congresso pregando a volta do militarismo."

E mencionou outro aspecto: a perseguição ao PT e a seus integrantes como inimigos. Como exemplo, citou a delação do empreiteiro Otávio Marques de Azevedo. Primeiro disse ter doado para ela, ao diretório do PT. "Porém mudou a versão e admitiu ter dados para o partido (PMDB) de Michel Temer. E ficou num 'ops, me enganei'. E quando não se tem um crime, não faz mal. A gente cria. É típico do estado de exceção, capaz de criminalizar atos legítimos em sociedade democrática e ao mesmo tempo perdoar outros", disse.

Para complementar o raciocínio sobre "os dois pesos e duas medidas", emendou o episódio do edifício La Vue, de Salvador, pivô da queda do ministro Geddel Vieira Lima e de uma crise envolvendo Temer. "Não consideram crime defender a construção de prédio que vai alterar a paisagem da cidade, tombada pelo Patrimônio Histórico. Assistimos estarrecidos e perplexos todas as tentativas do golpe dentro do golpe. Temos de ter a ousadia na defesa das eleições diretas, o que interessa às mulheres e homens do país."

PEC 55

A PEC 55, aprovada terça-feira (29) em primeiro turno no Senado, foi duramente criticada em seu discurso pelo caráter antidemocrático, de uma medida desenhada pela equipe econômica de um governo sem votos."Retira do direito, da decisão do voto, quanto se destinará a cada segmento, porque ao congelar o investimento, congela o voto. E o povo, as mulheres inclusive, vai ser levado a acreditar que não precisa votar."

Ela demonstrou preocupação com outros projetos que vão afetar diretamente a mulher: A terceirização, a precarização a superexploração do trabalho. "O peso dessas medidas vai recair mais sobre as mulheres.

Dilma elogiou a CUT. Para ela, a linha do tempo (dos 30 anos de políticas para as mulheres) é como uma trincheira na luta das mulheres. "É a consciência do movimento sindical de tratar a questão. E só há um jeito de seguir avançando: é nunca estar satisfeito."

Lógica dos privilégios

A lógica dos privilégios, que ganha ares de legitimidade em tempos de exceção, também foi atacada como ameaça ao amadurecimento das relações de gênero. Dilma lembrou que até o final do século 19 o Brasil era uma nação escravocrata. E que os reflexos dos 300 anos de escravidão, como o preconceito racial e a discriminação, perduram em todas as instâncias. 

"O pensamento aceito na época, de que uma minoria branca e rica tinha poder de vida e de morte sobre a maioria da população afrodescendente escravizada, ainda persiste e afeta mais a mulher, em especial a mulher negra e pobre – a maior face da miséria. Está por trás de histórias como a babá que, mesmo nos dias de hoje, não pode se sentar com patrões em clubes chiques do Rio de Janeiro, de existirem elevadores de serviço disfarçados de elevador de carga, e na desfaçatez de magistrados, como o atual secretário de Educação do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), Renato Nalini. Falo disso porque as mulheres são as mais prejudicadas. Por isso tenho orgulho de ter sancionado a lei das empregadas domésticas", seguiu Dilma

Quando foi presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Nalini chegou a dizer na TV que os altos salários do Judiciário não são imorais, pois "juízes precisam de ternos bons, que nem sempre podem ser comprados em Miami".

Gênero

Para reafirmar a importância para a autoestima das mulheres de suas duas eleições para a Presidência da República, Dilma voltou a contar o episódio em que foi abordada num aeroporto por um menina, que perguntou  ela se menina poderia ser presidente. "Essa história tem o sentido de demonstrar que as meninas podem, de que as mulheres podem ser presidentes. Diz respeito à decisão das mulheres de ser. Comemoramos hoje aqui a decisão de sermos protagonistas das nossas vidas, de nossa vida política e democrática."

No entanto, conforme lamentou, o país que sempre esteve atrasado quanto à paridade – o cumprimento da cota de mulheres na política sendo feito de maneira burocrática, num sistema político viciado – hoje experimenta retrocessos. "Hoje estão destruindo nossa capacidade de fazer política. Temos de discutir a representação da mulher em condições de igualdade. Ter conseguido direitos e espaços não quer dizer que basta, mas que é preciso avançar mais”.

Flores

Por fim, reforçou os cumprimentos às mulheres da CUT e à abertura de espaço às mulheres pela central, representada na solenidade pelo presidente Vagner Freitas, a secretária nacional da Mulher Trabalhadora, Juneia Batista. E, disfarçando uma ponta de emoção, agradeceu a todas as mulheres pelas flores que passou a receber no final de maio.

Sem mencionar o nome do então ministro da secretaria de governo de Temer, Geddel Vieira Lima, que proibiu a compra de flores para o Palácio da Alvorada, onde Dilma passou a residir antes do impeachment, contou que passou a recebê-las em sinal de solidariedade. “E desandei a receber flores. Na resistência ao impeachment foram vários os que se mobilizaram, como a Frente Brasil Popular, a Frente Povo sem Medo. Mas tenho de agradecer às mulheres da CUT, que me cobriram de flores. Nunca vou esquecer as flores e acredito em vocês para garantir avanços."


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