Rede Brasil Atual
Helder Lima
Um grupo com mais de cem profissionais ligados ao pensamento progressista, entre economistas, urbanistas, cientistas políticos e outros, lança nesta segunda-feira (28), às 15h, no Hotel Braston, em São Paulo, o documento "Por um Brasil Justo e Democrático", que pretende alimentar o debate sobre os rumos do país, propondo alternativas que apontem para uma nova política econômica de longo prazo, de forma que o país retome o combate às suas graves desigualdades sociais e garanta um futuro mais promissor às novas gerações.
O documento elaborado a partir de diversos artigos surge da insatisfação do grupo com os rumos que foram adotados pela política econômica do governo a partir deste ano. Aponta subsídios para um projeto de desenvolvimento social e alerta que o ajuste fiscal em curso não vai nesse sentido. "O que nós estamos destacando é que a questão fundamental é financeira, pelos juros em que o caso do Brasil é único, não tem similar no mundo. Há países com dívida bruta três vezes maior do que o Brasil, mas que pagam a metade de juros. Esse é o grande desajuste fiscal brasileiro", destaca o economista e professor da Unicamp Eduardo Fagnani, que coordenou a produção do trabalho.
Dividido em dois volumes, "Mudar para sair da crise - alternativas para o Brasil voltar a crescer" e "O Brasil que queremos - subsídios para um projeto de desenvolvimento nacional", o documento tem a participação de instituições com papel ativo na defesa dos trabalhadores, como a Fundação Perseu Abramo, a Plataforma Política e Social, o Brasil Debate, o Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento e a Rede Desenvolvimentista
"Nós temos clareza de que a crise, até 2014, tão difundida como uma crise terminal da economia brasileira, não encontra respaldo nos dados econômicos. O cenário econômico foi contaminado pelo cenário político", afirma Pagnani, ao analisar que a crise não encontra nos dados a gravidade defendida pelos neoliberais. Ele identifica o esforço da direita em desconstruir o governo a partir das eleições de 2014. "Então, é uma crise totalmente fabricada, de certa forma, pelo terrorismo econômico do mercado", destaca.
Essa opção liberal de política econômica impulsiona tentativas golpistas, na análise de Fagnani. "A nossa democracia é um evento tão recente e incipiente e até para a defesa da democracia é necessário mudar a política econômica. Existem outras alternativas, existe uma outra agenda que a gente também tem de se debruçar sobre ela, e não ficar restrito à agenda proposta pelos setores conservadores e pelo sistema financeiro."
A lógica de curtíssimo prazo só interessa ao sistema financeiro e o país não deve ficar sujeito a ela, segundo o economista da Unicamp Marcio Pochmann. "Este é um documento que vem sendo construído há mais de sete meses, com a preocupação de termos um olhar de médio e longo prazo para o Brasil", afirma.
Fagnani indica que o Brasil precisa flexibilizar a política econômica com base no tripé macroeconômico - controle da inflação, câmbio flutuante e metas de superávit primário - para poder voltar a crescer e avançar nas conquistas sociais. "O Banco Central é independente, sua única missão é fazer a inflação ir para o centro da meta, e só tem uma bala na agulha, que é aumentar a taxa de juros. Mas essa gestão ortodoxa já está superada, nem mesmo o FMI e o Banco Mundial defendem esse tipo de política. Já fizeram uma autocrítica sobre isso, diversos países já flexibilizaram esse tripé", afirma.
Para os autores do documento, um dos equívocos do governo Dilma é justamente a elevação dos juros de dois anos para cá. "Em 2013, a gente gastava cerca de 4,5% do PIB com pagamento de juros e hoje a taxa de juros está acima de 14%, e era 7,25% em 2013. A despesa com juros passou para 5,5% do PIB no final de 2014, e este ano estamos em 8% do PIB. Isso também contribuiu para que houvesse uma desaceleração da economia."
A solução não é simples, admite o economista, mas é necessário haver mudanças. "Essa política econômica vai ampliar o desemprego e a pobreza, certamente vai acontecer isso, que tirará o apoio ao governo dos setores que foram beneficiados nesses últimos anos com as políticas sociais.
Ajuste x desemprego x desigualdade social
O aumento do desemprego aponta uma situação dramática e exalta o fato de o ajuste fiscal penalizar o trabalhador. "Nós saímos de 13% de desemprego em 2001 e 2002, e em 2014 era 4,8% e agora já está em 7,5% e a previsão para o final do ano é que chegue a 9% e devemos perder um milhão de vagas formais. Em um ano de ajuste você está regredindo no esforço feito."
Para Fagnani, o desafio do Brasil para o futuro é encarar a desigualdade, suas diversas faces, na renda, no trabalho, desigualdade tributária, na riqueza agrária, na riqueza urbana, na oferta e no acesso de bens e serviços públicos, como saúde e educação. "E a macroeconomia deveria estar a serviço desse projeto, assim como a consolidação da democracia e a reforma política." Para tanto, é fundamental manter as conquistas da Constituição de 1988, hoje ameaçadas por uma onda conservadora no Legislativo.