por Hylda Cavalcanti, da RBA
Brasília – Os deputados contrários à proposta da reforma da Previdência reclamaram na madrugada de hoje (15) que a aprovação da admissibilidade da matéria resultou de uma manobra ilegal da base de Michel Temer. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287 foi votada por volta das 3h desta quinta-feira, depois de dez horas de discussão na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Os partidos governistas substituíram, na última hora, deputados que os representavam e eram contrários à matéria por outros, que se posicionaram favoravelmente.
A manobra – chamada de "gambiarra" pela deputada Maria do Rosário (PT-RS) – ocorreu sem qualquer protocolo prévio da comissão autorizando essas trocas, como exige o regimento interno da Casa. E irritou não apenas parlamentares da oposição, como Maria do Socorro Nunes (PT-RS), Alessandro Molon (Rede-RJ) e José Guimarães (PT-CE), mas também deputados que têm apoiado o Executivo, como Esperidião Amin (PP-SC) e Júlio Delgado (PSB-MG). Muitos ameaçaram apresentar recurso, contestando a forma como foi realizada a votação.
Mesmo com a adoção desse procedimento e a aprovação da admissibilidade da PEC, o governo não pode contar vitória. O resultado da votação foi de 31 votos favoráveis à matéria e 20 contrários. A diferença considerada pequena para os padrões da CCJ, na avaliação de analistas legislativos, mostra a dificuldade que a equipe de Michel Temer terá para aprovar a medida, daqui por diante. Ou sairá mais caro.
A sessão foi tensa e tumultuada. Os partidos de oposição tentaram forçar a apreciação de uma proposta do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que prevê eleições diretas para presidente e vice-presidente da República caso os dois cargos fiquem vagos até seis meses antes do final de seus mandatos. Hoje, esse prazo é de dois anos. Ou seja, caso Temer tenha intenção de renunciar no primeiro semestre, ou parte de sua base queira demovê-lo, sua substituição se daria por eleição direta, e não pelo colégio eleitoral do Congresso. A proposta foi barrada pela maioria governista na CCJ.
A votação da PEC nessa madrugada foi apenas referente à avaliação do mérito da proposta. Ou seja, tratou da sua admissibilidade. A partir desta aprovação é que será possível ser instalada a comissão mista especial que vai apreciar toda a matéria e dar início à tramitação. Mas, mesmo assim, a votação só pôde ser realizada mediante acordo firmado ontem entre oposicionistas e governistas.
É que, diante da insistência da oposição em obstruir os trabalhos e pedir pelo adiamento da votação para fevereiro, ficou acertado que eles (oposicionistas) deixariam a votação acontecer livremente e, em compensação, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assumiria o compromisso de deixar a instalação da comissão especial e todos os trabalhos referentes à PEC para fevereiro de 2017.
"Não era o que o governo queria, porque esperávamos ter a comissão instalada até sexta-feira (16), mas é o que foi possível conseguirmos", disse o líder do governo na Casa, André Moura (PSC-CE). "Mesmo que haja convocação extraordinária em janeiro, isso não muda nosso acordo", acrescentou ele.
Durante todo o tempo, a sessão foi marcada por discussões acaloradas. A deputada Maria do Rosário Nunes afirmou que não via condições de o tema ser discutido no Congresso em se tratando de uma mudança tão radical na vida dos brasileiros, proposta por um governo envolvido em denúncias de corrupção e com um mandatário que não se sabe dizer por quanto tempo ficará no cargo.
Votaram de forma contrária à PEC em bloco fechado os deputados do PT, PCdoB, PDT, Rede e Psol. Também foram contrários à matéria, integrantes da base aliada como Júlio Delgado (PSB-MG) e Marcos Rogério (DEM-RO).
Orientaram voto contrário à proposta, mas tiveram deputados que votaram de forma diferente da orientação partidária, siglas como PTB, PSB e PHS. E votaram de forma favorável PMDB, PSDB, DEM, PP, PR, PSD, Pros, SD, PEN, PTN, PSC, PPS e PV.
O deputado Marcos Rogério (DEM-RO) ainda ponderou que a PEC 287 diz respeito a direitos fundamentais e, da forma como se apresenta, "não pode ser aceita pela Câmara".
Chico Alencar (Psol-RJ) disse que, com a reforma, a proteção social da população brasileira está em jogo, porque a Previdência seria o único meio de prover um mínimo de dignidade aos trabalhadores pobres na velhice. "É o maior programa de políticas públicas de proteção social e distribuição de renda que temos no Brasil. A lógica não pode ser economicista, mas social."
Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a proposta fere a isonomia entre homens e mulheres, porque a aposentadoria mais cedo é o reconhecimento da dupla jornada que se exige das mulheres ainda hoje. "Isto está sendo rompido nessa proposta, o que foi colocado na Constituição como proteção vai ser desmontado", criticou.
Com informações da Agência Câmara