por Hylda Cavalcanti, da RBA
Brasília – Com a presença de parlamentares, representantes de federações, sindicatos e movimentos sociais, o Comitê Nacional de Defesa das Estatais lançou, hoje (18), na Comissão de Direitos Humanos do Senado, a campanha “Se É Público É Para Todos”, que tem o propósito de chamar a atenção da sociedade para as propostas legislativas que abrem brechas para a privatização dessas empresas. A campanha foi lançada durante audiência pública que discutiu a crise política, econômica, social e ética do país à luz dos direitos humanos, dentro do entendimento de que todos estes problemas estão diretamente relacionados ao que o comitê chama de “tentativa de desmonte do Estado”.
Por conta disso, os debates abrangeram não apenas as propostas que estão em curso para votação nos próximos dias, como a continuidade do Projeto de Lei (PL) 4.567, que flexibiliza as regras do pré-sal, a Medida Provisória (MP) 735, que altera as regras para as concessionárias do setor elétrico e o segundo turno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que congela os gastos públicos por 20 anos.
O secretário de Relações Internacionais e Empresas Privadas da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, lembrou que por causa da privatização feita na década de 1990, o país já perdeu todo o seu parque siderúrgico, a telefonia e boa parte do setor elétrico. “Além disso, antes do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a sociedade detinha 86% do capital acionário da Petrobras. Depois do governo FHC, passamos a deter apenas 40% desse capital”, reclamou.
Para o representante da FUP, a retomada de investimentos na companhia petrolífera feita a partir de 2003 possibilitou que a Petrobras voltasse a crescer. Ao passo que o resultado das privatizações como um todo, segundo ele, levou a perdas para o país, principalmente no segmento de metalurgia. “Em todas as áreas que foram privatizadas houve aumento de preços ao consumidor”, ressaltou.
Moraes também disse, ao comentar a PEC 241, que o governo Temer, por meio dessa proposta, vai ousar fazer a maior alteração já promovida na Constituição Federal de 1988. “E isso por parte de um governo ilegítimo”, acusou. “Quero lembrar aqui que nem FHC ousou tanto, e isso tendo sido eleito no primeiro turno, ao contrário deste, que não tem voto. Prefiro chamar o Temer de gerente do que de presidente”, acrescentou.
Já o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Jair Ferreira, afirmou que o bem público “parece que virou uma doença, um mal para o país, dentro dos argumentos que têm sido apresentados pelo governo de Michel Temer”. "No entanto, o que vemos é que as empresas públicas são um caminho para o cidadão que precisa dos serviços do Estado."
De acordo com o dirigente da Fenae, “se avaliarmos a década de 1990, veremos que tirando poucas exceções, os bancos públicos foram liquidados”. “Esse sistema financeiro foi reconstruído a partir de 2003, tanto que a Caixa Econômica, naquela época, tinha cerca de 2 mil funcionários e hoje conta com 4 mil. Também foram ampliados os serviços oferecidos, a Caixa passou a gerir programas como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e houve a centralização do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), quando se criou um conselho curador. A partir daí, por meio desse sistema, os trabalhadores passaram a saber onde estava o seu fundo de garantia. E é isso que estão querendo acabar”, acrescentou.
O diretor de Relações Sindicais do Sindicato dos Bancários de Goiás, Willian Louzada, ressaltou que em toda a história recente do país tem sido observado, agora, o maior ataque já visto à classe trabalhadora. Ele conclamou a todos para que o debate seja levado para os chãos de fábrica e para as ruas, de forma que a classe trabalhadora fique ciente de todas estas ameaças. “É importante que tenhamos acesa essa luz e consciência de que a luta precisa ser de todos nós”, disse.
A coordenadora do Comitê de Defesa das Estatais, Maria Rita Serrano, afirmou que a desculpa errada para a tramitação das propostas legislativas que ameaçam o país é a corrupção. “Infelizmente, este é um problema endêmico e de visão e formação ideológica para o capitalismo. Todos somos contra a corrupção e os argumentos apresentados para justificar estas propostas estão errados. A questão é outra: temos 1% da população do mundo com mais de 90% da renda mundial. Se alguém tem muito, falta dinheiro em algum lugar”, explicou.
Rita disse que a campanha visa a conscientizar a população sobre “a importância do público, do coletivo, do que é social”. “A ideia é popularizar a campanha, que já foi lançada em 14 estados. Mostrar tudo o que está em jogo, porque ou nos movimentamos, ou os parlamentares votam contra estas matérias, ou resistimos. Caso contrário, vamos levar anos para nos recuperar dos prejuízos a serem observados.”
Para a senadora Erika Kokay (PT-DF), não é possível tratar os ataques do governo Temer de forma isolada. “O que estamos vendo é um ataque a todo o patrimônio público. É importante que todos procurem os deputados da sua base, porque isso é muito sério”, alertou.
Erika ressaltou ainda que o que existe hoje no Congresso é um “pacto de bengalas, casacas e cartolas que parece excluir a sociedade brasileira”. “Não é verdade que está em curso um Estado mínimo para o país. É Estado mínimo para o povo, mas um Estado forte e cheio de volúpia para a elite.” A senadora Regina Souza (PT-PI) disse que o Senado ainda é a caixa de ressonância de debates dos projetos polêmicos e que representam perdas. De acordo com ela, os senadores de tudo farão para aprofundar a discussão e impedir a aprovação destes textos. “Estamos aqui para contribuir com vocês”, afirmou.
Outros senadores, como o presidente da comissão, Paulo Paim (PT-RS), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Fátima Bezerra (PT-RN), também destacaram que o tema a ser discutido deve ser a crise política e econômica, de forma a conscientizar a população de que o que de fato está em curso no país é um desmonte do Estado e uma proposta para colocar o Brasil num caminho privatista.
Os parlamentares, sindicalistas e representantes dos movimentos prometeram coletar o máximo de assinaturas, para permitir a criação da chamada Frente Parlamentar Mista em Defesa das Estatais. Eles continuam no Congresso para acompanhar, das galerias, a votação das emendas de destaque, na Câmara, do PL 4.567 e no Senado, da MP 735. Mas, diante do atraso para início da sessão conjunta do Congresso, que termina atrasando as sessões nas duas Casas, não se sabe se os textos poderão ser apreciados ainda hoje.