Escrito por: Érica Aragão - CUT
Com indícios de aumento de juros e as sinalizações do governo em mexer na Previdência, a CUT e os movimentos sociais mandam o recado: “Somos contra qualquer medida que retire direitos”.
Desde o fim do primeiro mandato da Presidenta Dilma Rousseff, as medidas econômicas executadas pelo governo federal vem desapontando a classe trabalhadora. Joaquim Levy, então Ministro da Fazenda em 2014, já iniciou seu mandato atacando os direitos dos trabalhadores com as Medidas Provisórias 664 e 665, que dificultam o acesso à políticas sociais como seguro desemprego e pensão por morte. Mesmo trocando o ministro, agora Nelson Barbosa, a ameaça de ataques aos direitos já conquistados ainda paira.
O sociólogo e cientista político Emir Sader conversou com o Portal da CUT e analisou alguns pontos da atual política econômica.
O pacote de ajustes implementado pelo governo federal desde o fim de 2014 foi inevitável?
Claro que não. Nenhum pacote é inevitável, menos ainda este que foi muito polêmico. Porque não foi a forma que o governo reagiu com sucesso `^a crise de 2008. O que o governo fez foi assoprar a favor do vendaval ao invés de resistir a estas tendências.
Então, não foi só inevitável, como foi socialmente injusto, pois recaiu nas costas do trabalhador. Economicamente ineficiente porque os cortes sempre levam a mais recessão e não a retomada do crescimento econômico. E politicamente desastroso porque isolou o governo de suas bases populares e fez ficar fragilizado diante dos ataques golpistas da oposição.
Especialistas garantem que em meados de 2016 a crise econômica pode piorar. Por que chegamos nesta situação?
Chegamos nesta situação porque o governo fez uma leitura equivocada dos resultados das eleições. Tendo ganho por muito pouco, não poderia ter se afastado das forças populares que evidentemente votaram nele. Segundo, não poderia ter acreditado que recuperaria a confiança do mercado e com isso a retomada dos investimentos. É verdade, pela primeira vez que um presidente é eleito no Brasil com a oposição, praticamente total, do grande capital. Obviamente que no capitalismo os recursos contam, porém a forma para reativar a economia não foi incentivar os investimentos, mas foi entrar na onda de cortes, ajustes e sobretudo nos cortes dos recursos sociais e nos direitos dos trabalhadores. Então foi uma maneira de acentuar a recessão que começava a se mostrar.
Qual seria a saída para esta crise sem prejudicar os trabalhadores?
Socializar e democratizar o acesso ao crédito para incentivar os investimentos. Agora, pra isso, tem que fazer exatamente o oposto que o governo está fazendo. Nós estamos na iminência de um novo aumento da taxa de juros, que sequer controla a inflação, porque não se trata de demanda que pode ser controlada diminuindo o poder de compras das pessoas. O aumento da taxa de juros durante um ano não trouxe nem o controle da inflação e nem a retomada do crescimento. Ao contrário, aumentou a recessão e o pior, estamos no segundo ano de estagnação. Estagnação junto com inflação.
Na verdade, os recursos para incentivar os investimentos não estão nos bolsos dos trabalhadores, estão no imposto nas grandes fortunas, na herança, no combate duro à sonegação.
Os movimentos sindical e social defendem a taxação das grandes fortunas e a auditoria da dívida pública como maneiras de fazer os ricos pagarem a conta da crise. Isso é possível?
Todos os economistas minimamente identificados com o governo estão a favor disso. As mobilizações de apoio ao governo foram unânimes na rejeição a qualquer via golpista, unânimes à rejeição do ajuste fiscal, da política econômica. Mas o governo não nos ouve, sequer consegue interlocução com setores do grande empresariado, que continua se valendo da alta taxa de juros para especular. O governo deveria ter feito uma balanço do primeiro ano, especialmente da política econômica, para saber porque vai insistir. O governo está dando mais purgante pro doente até que não tenha mais condição para reagir. Eu acho que essa é uma via totalmente equivocada.
O que muda, na prática, com a saída do Levy e a chegada do Nelson Barbosa?
Não se esperava uma virada radical, o governo da Dilma não é disso. Com Nelson Barbosa há uma certa flexibilização, porque com o Levy o ajuste fiscal era uma via estratégica, para o Nelson é tática para recompor as finanças públicas. Nelson Barbosa colocou em pauta mais um tema polêmico que é a reforma da Previdência, que não vai conseguir implementar, vai ficar um desgaste, e é um diagnóstico equivocado. Não é a previdência que vai controlar as despesas públicas. Com a alteração das idades na aposentadoria as reconquistas dos recursos só se dariam a longo prazo. Então não é eficiente. A única coisa que ele flexibilizou foi a abertura de créditos dos bancos públicos para empresas, principalmente as pequenas e médias que são na verdade quem geram emprego no Brasil.
E agora a sinalização de que nesta semana o juros aumente, mais uma vez um diagnóstico equivocado. Aumentando a taxa de juros o governo está indo na contramão para o crescimento.
Como a crise na China afeta mercados emergentes como o Brasil?
Relativamente afeta, é claro. Uma parte pela diminuição de compra, outra parte é que a China investe menos. Essa segunda parte é menos evidente, mas pode acontecer. Agora, o crescimento da China continua, voltado para o mercado interno, não há nenhuma recessão lá, qualquer país que crescesse 6% a 7% estaria feliz hoje.
Qual o papel da juventude na volta do crescimento do país?
Eu acho que é de batalhar para que o país volte a crescer, mas principalmente para que grande parte dos recursos do governo sejam destinados para políticas de juventude, que é a grande maioria da população. Aliás é o setor mais mobilizado que luta pela sobrevivência, sobretudo nas camadas mais pobres. O maior escândalo é o genocídio dos jovens negros, deveria ser o setor fundamental na interlocução do governo.
A política econômica levou a crise política ou a crise política levou a crise econômica?
Claramente, a crise econômica esvaziou o apoio popular do governo no que resultou a crise política. Tanto é assim que a crise política amainou, mas o governo continua a aplicar duras medidas econômicas. É o inverso, isso vai voltar a incentivar a crise política, porque ninguém quer fazer acordo, ninguém quer apoiar um governo fragilizado como este, pela falta de apoio popular.
Na sua opinião, ainda há riscos para o impeachment?
Os riscos que existem são porque com um governo fragilizado qualquer setor corporativo se sente no direito de questionar. E a oposição com a única bandeira que ela tem vai tentar reiterar esse tema. Mas eu acho que nunca foi possível, e agora menos provável ainda. Eu acho que o impeachment sai da agenda e a agenda mais importante passa a ser a econômica e social do Brasil.