A Contraf-CUT criticou nesta sexta-feira (25) a tentativa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de votar até o final do ano o substitutivo do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) ao projeto de lei que dá autonomia ao Banco Central (BC), o PLS 102/2007. De acordo com o substitutivo, atualmente em debate na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o presidente do BC e os diretores da instituição devem cumprir seis anos de mandato, podendo ser reconduzidos uma vez.
"Essa proposta afronta a democracia", afirma o secretário de Organização da Contraf-CUT, Miguel Pereira, rebatendo a desvinculação do mandato dos diretores do BC com o do presidente da República. "Querem tornar o BC independente da vontade da maioria da população para torná-lo completamente dependente dos interesses do mercado financeiro", aponta.
Calheiros não descartou a possibilidade de o mandato ficar em quatro anos, com uma possível recondução, em período diferente do período do presidente da República. "Vamos votar ainda este ano. [Esse] é o meu empenho, é o meu compromisso", disse Renan ao discursar em plenário nesta sexta.
Pelo substitutivo, a demissão do presidente ou dos diretores do BC pelo presidente da República terá de ser justificada e previamente aprovada pelo Senado, assim como a nomeação. O Brasil é o único país, entre os que adotam o regime de metas de inflação, cuja diretoria de Banco Central não tem mandato fixo. Depois de aprovado pelo plenário do Senado, o projeto segue para discussão na Câmara.
"Defendemos que o BC não tenha como única obrigação proteger o valor da moeda, mas outras questões, como ter metas de criação de empregos na economia", ressalta Miguel. "Como deixar que somente poucas pessoas definam a política de juros, crédito e, câmbio, independentes do projeto político escolhido pelo povo através de eleições democráticas e diretas?", questiona o dirigente da Contraf-CUT.
A proposta, que enfrenta resistência do governo e tem sido combatida pela Contraf-CUT, foi esquentada nesta semana com a divulgação do novo estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre a situação atual da economia brasileira e as perspectivas para os próximos anos. O documento sugere que os dirigentes do BC tenham mandato com prazo determinado e que somente os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) se pronunciem sobre os juros.
Renam disse que "o Brasil já está maduro para esse debate, e não devemos contaminá-lo ideologicamente. A discussão com relação à independência do Banco Central é uma discussão técnica, somente técnica. A principal função de qualquer Banco Central é zelar pela defesa do mais importante patrimônio de uma economia: sua moeda. No momento em que o Banco Central possa, por ausência de autonomia, ser pressionado, ele corre o sério risco de perder respeito e credibilidade dos agentes econômicos".
Miguel concorda que o Brasil está bem maduro. "Maduro o bastante para rejeitar mais essa tentativa de golpe", alerta. "Além disso, afirmar que esse tema é puramente técnico é conversa pra boi dormir. Não podemos cair nessa armadilha", enfatiza o dirigente sindical. "Ele é um tema eminentemente político. A cada escolha, a sociedade e particularmente os trabalhadores, tem um preço a pagar e alguém vai ganhar, geralmente os banqueiros, como temos visto sempre", salienta.
Ainda segundo o presidente do Senado, para melhorar o que já está bom, para um projeto nacional de desenvolvimento autônomo e sustentável, é inevitável que o BC, fortalecido, tenha independência e fique imune aos interesses vindos da esfera política, partidária e governamental ou até mesmo da vida privada. "Um Banco Central independente é a garantia de que a saúde da economia será sempre diagnosticada com olhos técnicos, isentos, descontaminados da miopia apaixonada das circunstâncias."
O diretor da Contraf-CUT aponta que "um dos papéis do BC é a definição do crédito. Outro é a fiscalização do sistema financeiro porque os bancos são concessões publicas e sua matéria prima são todos os recursos da sociedade brasileira. Portanto, nada mais legítimo do que garantir tamanha blindagem para quem desempenha esse importante papel fiscalizador e regulador".
A Comissão de Assuntos Econômicos promove uma série de audiências públicas para debater a proposta. No mês passado, o texto foi defendido por economistas de bancos como o Credit Suisse e Bradesco. À época, Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, previu "impacto institucional" semelhante a um Plano Real para a adoção da independência operacional do BC. Segundo ele, o Brasil está maduro em relação ao tema, e a politização em torno dele "já perdeu o sentido".
"A manifestação favorável do Bradesco mostra de que lado estão os banqueiros", observa Miguel. "Nós temos clareza quem ganha e quem perde e, por isso, precisamos mostrar para a sociedade que esse projeto não traz vantagens e só atende os interesses do capital financeiro", conclui Miguel.
Fonte: Contraf-CUT com Agência Brasil