Durante encontro do macrossetor indústria, entidades sindicais definem que pauta também incluirá mudanças no Programa Brasil Maior
Escrito por: Luiz Carvalho - CUT
O Brasil precisa pensar uma estratégia a longo prazo para construir uma indústria inovadora, de alto valor agregado e mais criativa. Ao mesmo tempo em que necessita urgente de um programa de proteção ao emprego como uma resposta ao momento de crise, com queda da produção e perda de postos de trabalho.
Para os dirigentes das entidades que compõem o macrossetor da indústria da CUT, esses são os pontos essenciais da pauta a ser apresentada em audiência com o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Mauro Borges, nesta quarta-feira (28).
As discussões durante encontro do macrossetor nessa terça (27), em São Paulo, tiveram como destaque o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), um instrumento adotado pela Alemanha há 40 anos e que permite reduzir parte da jornada de trabalho com redução de salário durante um período determinado. Desde que os trabalhadores aprovem o acordo em assembleia e sob a condição de impedir demissões.
“O nosso sistema de emprego, ao invés de usar recursos para manter o trabalhador empregado, usa para mantê-lo desempregado. O modelo alemão que discutimos aqui, não. Em momentos de crise, quando a produção industrial é afetada, as horas não trabalhadas são custeadas por um fundo que é bancado pelo Estado e pelos empresários para manter o trabalhador empregado e é isso que estamos propondo”, explicou o secretário-Geral da CUT, Sérgio Nobre.
Ponto de vista –Direto da Alemanha, o dirigente do sindicato IG Metal, Flávio Benites, explicou como funciona o modelo: caso o acordo seja aprovado em assembleia, o empregador passa a pagar o tempo efetivamente trabalhado e fica impedido de fazer dispensas. O Ministério do Trabalho alemão é quem custeia até 67% do valor líquido do salário e os sindicatos podem negociar com o patrão uma complementariedade de até 99% dos vencimentos.
O prazo máximo de aplicação do programa é de 12 meses, que podem ser prorrogados por mais 12, e a empresa precisa atender a alguns pressupostos como comprovar que está em dificuldade econômica por conta de fatores que não são de sua responsabilidade, mas sim conjunturais. “Com o programa, o impacto da crise na economia é menor, porque mantém os empregos e, portanto, o poder de compra e consumo. E é interessante do ponto de vista empresarial, porque permite aos empregadores não sucatearem a mão de obra e, assim, com a manutenção dos trabalhadores, terem capacidade de se reerguerem com maior rapidez. Além de evitar os altos custos do Estado e do poder privado com demissões”, avaliou Benites.
No caso brasileiro, um acordo costurado em um grupo de trabalho formado por movimento sindical, empresarial e governo definiu que o PPE seria válido por seis meses e poderia ser prorrogado por mais seis. Da mesma forma que no modelo alemão, só poderia ser implementado em situações de crise e se limitaria à redução de 30% da jornada. Das horas não trabalhadas, 50% seriam custeadas pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e as empresas pagariam 100% dos encargos (como INSS). O restante seria negociado. O projeto, porém, está nas mâos do governo, que ainda não apresentou um texto final.
Durante o encontro do macrossetor, o presidente da CUT, Vagner Freitas, criticou a forma como o debate tem sido conduzido pelos meios de comunicação. “Não entrem nesse falso debate da mídia burguesa, não tem flexibilização da legislação trabalhista. Esse é um instrumento de luta e só se pratica com sindicato representativo, porque na assembleia mais da metade dos trabalhadores têm de estar presente e aprovar”, alertou.
Igualar– Para Nobre, outra prioridade que será levada ao ministro é a retomada dos grupos de trabalho do Plano Brasil Maior, programa industrial brasileiro. O entrave está na atuação de alguns setores que não avançaram como outros. “O que observamos é que alguns grupos de trabalho evoluíram por sua tradição de negociação, como é o caso do setor automobilístico, setor químico, alguns segmentos dentro da indústria naval, mas outros importantes como o vestuário e a construção civil, não. E isso aconteceu porque o movimento sindical entrou nesse debate de maneira desarticulada. Precisamos retomar essa discussão com uma visão comum de indústria, articulando experiências. O momento de crise que estamos vivendo é de oportunidade, de darmos grandes saltos”, definiu.
Brasil não é competitivo – A avaliação de que a indústria não vai bem é comum e, em muitos aspectos, a visão do diretor do representante do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) Adilson Sigarini coincidiu com a de economistas do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Especialmente na necessidade de investir em educação, pesquisa, desenvolvimento e aumento da produtividade, em conjunto com a atualização tecnológica de produtos.
Economista do Dieese, Clemente Lúcio, apontou a urgência de uma política de conteúdo nacional para impedir que multinacionais continuem se instalando no Brasil sem transferir tecnologia, e remetendo lucros para as matrizes. Sem conhecimento, apontou, não é possível construir um sistema de produção industrial que agregue valor à matéria-prima.
Outro aspecto é a formação. Ele explicou que grandes empresas trazem inovação e pesquisa, mas as pequenas e médias, maior parte das empregadoras do país, responsáveis por 60% das carteiras assinadas, não conseguem. Aí entra o papel do Estado na qualificação dos trabalhadores. “Precisamos criar link entre universidade e pequenas e médias empresas, o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) precisa ser reestruturado”, defendeu.
A falta de qualificação se reflete na capacidade produtiva. De acordo com levantamento deste ano da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), enquanto na Alemanha a microempresa consegue produzir o equivalente a 67% da grande, no Brasil, esse índice é de 10%, contra 24% da Argentina.
Para Lúcio, o movimento sindical deve cobrar também a reforma do Sistema Nacional de Intermediação de Emprego (Sine) e, em âmbito geral, exigir que o trabalho ocupe o centro do projeto brasileiro.
Na definição do também economista do Dieese, Leandro Horie, lutar para que a política industrial esteja ao lado dos trabalhadores.