À primeira vista, tudo seria melhor e mais rápido. O trabalhador com casos de doenças ou acidentes, com afastamento de até 60 dias, poderia ter o benefício concedido pelo INSS sem perícia médica. Para quem espera meses na fila pelo atendimento, a nova proposta da Previdência Social aparentemente seria a solução. Mas o que parece ser facilidade pode gerar problemas ainda mais graves.2014-02-24O alerta é feito pelo secretário de Saúde do Trabalhador da Contraf-CUT , Walcir Previtale. "Somos contra o projeto apresentado pelo INSS porque deve colaborar para o aumento da subnotificação dos acidentes e doenças do trabalho, uma vez que a proposta facilita a concessão dos benefícios previdenciários e dificulta, e muito, a concessão dos benefícios acidentários, quando dispensa o trabalhador de perícia médica somente para os casos chamados de doença comum". Projeto interministerial Além da Previdência Social, os ministérios do Trabalho e Emprego, Assistência Social e Saúde também analisam o projeto. Pela proposta, o tempo de afastamento seria determinado pelo tipo de doença ou gravidade do caso. O atestado médico fornecido por qualquer médico que tenha assistido o trabalhador, seja da rede pública ou da rede privada, servindo de prova para o INSS conceder o benefício.
De acordo com o INSS, um dos objetivos é descentralizar a concessão do auxílio-doença das mãos dos peritos médicos e dar mais rapidez para o recebimento do benefício.Falhas na nova concessãoMas as possíveis mudanças na concessão do benefício não geram preocupação apenas para as entidades que representam os trabalhadores, como a Contraf-CUT. Pesquisadores da área da saúde também têm se posicionado contrários às propostas do INSS.A médica do trabalho e pesquisadora da Fundacentro, Maria Maeno, acompanha a discussão desde 2005, quando o assunto entrou na pauta da 3ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, que aconteceu em Brasília. Em conjunto com outros profissionais, a profissional levantou diversos problemas que poderiam prejudicar os beneficiários, como falhas no processo de recuperação do trabalhador."Menos segurados seriam encaminhados à reabilitação profissional do que atualmente e o sistema informatizado não teria condições de avaliar a pertinência desse encaminhamento. Como agravante, nos casos em que as condições de trabalho tivessem sido determinantes para o adoecimento, ao retornar à empresa a tendência seria a piora do quadro clínico do trabalhador e muitas vezes de forma irreversível", afirma Maeno.Impactos na CATO Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho de 2012, divulgado pelo Ministério da Previdência Social, revela que foram registrados 705.239 acidentes contra 720.629 em 2011. Houve uma pequena redução, mas o total continua acima dos 700 mil por ano, o que é ainda alarmante. No Brasil, a cada sete benefícios concedidos por afastamento por doença relacionada ao trabalho, um é por acidente.Alguns municípios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Maranhão já estão aplicando a nova concessão do auxílio-doença. Segundo o INSS, as medidas foram tomadas depois de ações públicas contra a demora no atendimento. Em Santa Catarina, por exemplo, quando a agenda dos peritos ultrapassar 45 dias, o segurado pode requerer o benefício apenas com um atestado médico.Para Walcir, com as novas regras, as empresas ganham mais um instrumento para fragilizar ainda mais o sistema da CAT (Comunicação de Acidente do Trabalho) e desaparecer com as ocorrências de acidentes e doenças relacionadas com o trabalho, considerando o procedimento discriminatório patrocinado pelo INSS logo na porta de entrada do sistema previdenciário, tendo tratamento diferenciado para direitos iguais, previstos na Constituição Federal. "O impacto social também é grande, as empresas garantem sua imagem no mercado, como empresas limpas, empresas risco zero, empresas sem acidentes. Desta forma, o próprio INSS fica impedido de entrar com ações regressivas, previstas em lei, que obriga as empresas que acidentam e adoecem a reembolsarem os cofres públicos, com a devolução do que foi pago em casos de acidentes do trabalho. Logo, quanto maior a subnotificação das ocorrências dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, toda a sociedade perde com essa prática política. Aliás, nem todos perdem. As empresas ganham", destaca Walcyr.Perda de direitos trabalhistasA médica também aponta outro agravante, como a possível redução de direitos trabalhistas. "Ao saber que pode receber o auxílio-doença previdenciário, de mesmo valor do auxᆳlio-doença acidentário, sem passar por perícia, o trabalhador provavelmente preferiria abrir mão da sua condição de acidentado do trabalho a ter que solicitar a emissão da CAT pela empresa e esperar a perícia, correndo o risco de ter o benefício negado. Mas ao abdicar do caráter ocupacional de seu acidente ou adoecimento, o trabalhador deixa de ter o seu fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS) depositado e não tem mais direito à estabilidade de um ano após o retorno ao trabalho", alerta. A pesquisadora da Fundacentro escreveu um editorial na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (RBSO) sobre as possíveis mudanças no auxílio-doença.> Clique aqui para ler o texto de Maeno.Fonte: Contraf-CUT