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4 de Março de 2015 às 18:15

05/03/2015 - Lei Maria da Penha reduz em 10% morte de mulheres por violência doméstica


FLICKR/GOVERNO DA BAHIA

Impacto seria maior se houvesse políticas públicas de combate à violência e oferta de serviços de apoio nos bairros e nas comunidades

por Gisele Brito, para a RBA

São Paulo – A Lei Maria da Penha foi responsável pela redução de 10% na taxa de homicídios contra mulheres dentro das residências brasileiras entre 2006 e 2013. É o que aponta a pesquisa Avaliando a Efetividade da Lei Maria da Penha (LMP), do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgada hoje (4), em Brasília.

A LMP não tem como objetivo principal conter os homicídios, crime tipificado anteriormente no Código Penal, e sim outras formas de agressão contra a mulher nas relações familiares, como a psicológica e patrimonial. Por isso, o estudo considerou que, sendo o assassinato a 'ponta do iceberg' de ciclos de violência, uma das consequências da lei seria a diminuição de suas taxas.

O estudo considera apenas o impacto nos crimes ocorridos dentro de casa, situação mais comum nos crimes atingidos pela LMP, que tem caráter doméstico. Segundo o Mapa da Violência, indicador que leva em conta registros do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde, entre 2000 e 2011 foram assassinadas, dentro e fora de seus lares, 46,1 mil mulheres.

A lei é considerada uma das maiores vitórias dos movimentos feministas nas últimas décadas por tratar, pela primeira vez, a violência contra a mulher como acontecimento relevante na sociedade, e não ocorrência da vida privada, e a propor o combate à violência com mudanças estruturais na prevenção e punição. Antes de sua criação, os agressores eram punidos com penas leves, muitas vezes restritas à oferta de cestas básicas a serviços de caridade. Diante de uma situação de iminente violência, o Estado não tinha instrumento legal para proteger as mulheres, que, por falta de opção, continuavam a viver com seus algozes.

Para o estudo, os pesquisadores criaram uma fórmula em que consideram a presença de aparatos institucionais criados pela lei em cada localidade. A avaliação é que isso aumenta o medo dos agressores em relação à punição que podem sofrer ao agredirem uma mulher. Portanto, onde existem tais aparatos, o efeito da lei é maior. O problema é que são oferecidas em poucas localidades do país, o que restringe o impacto da legislação.

Abrigos

Outro estudo do Ipea, também divulgado hoje, mostra que centros especializados para a atenção à mulher, com serviços que prestam atendimento jurídico, psicossocial e de acolhimento, por exemplo, só estão presentes em 191 das 5.561 cidades brasileiras. No total são 214 unidades, a maioria delas na região Sudeste. Abrigos que dão amparo às mulheres e seus filhos no caso em que é preciso garantir um afastamento imediato do parceiro agressor são insuficientes: apenas 77 em todo o país, espalhados em 70 cidades, o equivalente a 1,3% do total.

Juizados especiais, varas, núcleos em promotorias e defensorias públicas dedicados ao atendimento às mulheres vítimas de violência, apesar de determinação legal, estão presentes apenas em 0,6% das cidades do país.

O mapeamento constatou ainda que os organismos de políticas públicas avançaram um pouco mais sua abrangência, o que é importante para garantir a elaboração, monitoramento e coordenação de políticas votadas para o público feminino na esfera executiva. Quinhentas e sessenta cidades contam com esse tipo de instituição, em geral subordinadas ou parceiras de prefeituras.

Para a consultora do Instituto Patrícia Galvão, Fernanda Matsuda, apesar de morosa, a expansão da rede tem ocorrido. No entanto, ainda é preciso efetivá-la. “O sistema de justiça, por exemplo, é refratário em relação à Lei Maria da Penha. Nós observamos que os tribunais do Júri, por exemplo, não a aplicam”, pontua.

Para Fernanda, a resistência tem a ver com desconhecimento e também com o machismo dos operadores do direito. “O sistema de justiça é um reflexo da sociedade e dá respostas machistas. Nós observamos que, por exemplo, a vida pregressa das mulheres vítimas é questionada, em um discurso muito moralizante. Então se ela não se enquadra nos estereótipos de boa mãe, boa filha, boa esposa. A vítima pode ser tratada como se tivesse contribuído para o próprio crime cometido contra ela”, afirma.

Em função disso, a bacharel em direito considera muito importante a aprovação, ontem (3), do Projeto de Lei 8305/2014, que tipifica os crimes de feminicídio, classificando-os como hediondos. “É muito importante, porque passa uma mensagem muito clara para a sociedade e para os operadores de direito de que esse é um problema que existe e é muito grave”, pontua.

O texto aprovado vem sendo discutido há muitos anos e é um desdobramento das articulações dos movimentos de mulheres para garantir mais instrumentos legais de proteção, iniciado com a Lei Maria da Penha, e ganhou novo fôlego depois das declarações consideradas machistas e de apologia ao estupro do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) contra a deputada Maria do Rosário (PT-RS).

A lei caracteriza o feminicídio como crime motivado por menosprezo ou discriminação contra as mulheres e em situações domésticas e familiares. A pena para quem cometer esse tipo de delito pode variar de 12 a 30 anos e pode aumentar caso seja cometido contra menores de 14 anos ou maiores de 60, contra gestantes e na presença de filhos ou pais da vítima.

“O objetivo não era aumentar a pena. Mas deixar claro na lei que aquele caso não é um caso pontual, motivado por abuso de álcool ou drogas, mas um problema social de desigualdade de gênero. É uma mensagem muito forte”, explica Fernanda. A lei ainda precisa ser sancionada pela presidenta Dilma Rousseff.


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