“O trabalho nas agências digitais se equivale ao telemarketing, porém sem as normas específicas de segurança e saúde aplicadas nas centrais de atendimento”. Esse é um dos principais dados da pesquisa Patologias e Adoecimento no Trabalho Bancário em Banco Digital, realizada pelo Sindicato, e cujos resultados “preocupantes” foram apresentados nesta terça-feira (15), na sede da entidade.
Pioneira no país, a pesquisa recebeu o título de Telemarketing 2.0. Feita em parceria com o Grupo de Estudos em Práticas Clínicas, Trabalho e Saúde (Gepsat), o Laboratório de Psicodinâmica e a Clínica do Trabalho da UnB, foi lançada em fevereiro de 2018, motivada pela observação das condições de estresse nos escritórios digitais e dos depoimentos de adoecimento dos bancários.
Sob a coordenação da professora Ana Magnólia, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da UnB, a pesquisa contou com o apoio da psicóloga e pesquisadora Fernanda Duarte, e teve a participação de 36 bancários, que, por meio de entrevistas e questionários, descreveram a vivência do trabalho nas agências digitais.
Lucro acima de tudo
Ana Magnólia observou que o medo de participação na pesquisa por parte dos trabalhadores aumentou em relação a abordagens anteriores. “Foi muito difícil conseguirmos os entrevistados”. Ela reiterou que o sofrimento e adoecimento dos trabalhadores são causados pela organização do trabalho, que visa o lucro acima de tudo e de todos.
A professora da UnB destacou que os resultados da pesquisa são um passo fundamental para dar visibilidade a essa modalidade de organização do trabalho, em plataforma digital, que tem gerado muitas queixas dos trabalhadores, sofrimento e afastamentos. “É uma oportunidade para identificar esses riscos e construir coletivamente estratégias de luta para prevenção e promoção da saúde do trabalhador”, enfatizou.
Estratégias de ações
“Não estamos fazendo uma campanha contra o avanço tecnológico, mas da forma como ele está sendo utilizado”, ressaltou a secretária de Saúde do Sindicato, Vanessa Sobreira, que lamentou o retrocesso imposto no ambiente de trabalho dos bancários.
Vanessa esclareceu que, a partir desses resultados, o Sindicato vai discutir estratégias de ações mais efetivas para tirar os trabalhadores dessa situação de adoecimento físico e mental.
Ex-secretária de Saúde do Sindicato, Mônica Dieb, que teve a iniciativa de lançar a pesquisa durante sua gestão, falou de sua felicidade em ver o trabalho efetivado, porém lamentou as tristes constatações do trabalho. “Agora, precisamos fundamentar nossa ação política de intervenção, durante as negociações com os bancos, para impedir que a categoria caminhe para um trabalho robotizado, uma vez que os estudos apontam para esse risco”.
Mônica criticou o modelo de gestão baseado na ameaça e ressaltou que a categoria deve continuar unida. “Nós podemos e devemos reagir, mobilizando os trabalhadores”.
Riscos e adoecimentos
Os bancários entrevistados pela pesquisa consideram o trabalho em agências digitais desvantajoso em comparação ao trabalho em call centers, “que têm jornada de seis horas, pausas obrigatórias e ajustes de condições de trabalho (mobiliário e equipamentos necessários)”. Nas agências digitais, os trabalhadores ficam expostos a riscos que vêm longamente sendo debatidos.
Quanto à satisfação com o trabalho nas agências digitais, 88% consideram-se insatisfeito e 91% pensam em deixar o trabalho na agência digital em busca de outras opções.
A maior parte desses trabalhadores afirma ter se afastado pelo menos uma vez por motivos de saúde desde que iniciou as atividades em agência digital (76%), sendo que 92% deles consideram que o adoecimento foi relacionado ao trabalho.
Com relação aos cuidados com a saúde, 27% estão sob acompanhamento psiquiátrico, 36% sob acompanhamento psicológico e 61% sob algum tipo de acompanhamento médico não especificado. Todos os nove acompanhados por psiquiatria estavam fazendo uso de remédios psiquiátricos e a maioria deles em outros acompanhamentos médicos (49%) estava utilizando algum medicamento prescrito. Também houve casos de automedicação (37%).
Complexidade do sistema bancário
O Telemarketing 2.0 destaca que o sistema bancário brasileiro é marcado por sua complexidade. É composto por pessoas físicas e jurídicas interagindo em segmentos públicos ou privados com portes distintos. Em 2016, havia um total de 1.454 instituições financeiras no país, entre as quais 138 conglomerados, bancos comerciais e múltiplos, bancos de desenvolvimento e a Caixa.
No Brasil existem os bancos exclusivamente digitais e os digitalizados – bancos tradicionais que possuem agências físicas e digitais.
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Mariluce Fernandes
Do Seeb Brasília