A humanidade, desde os primórdios, tem dificuldade em lidar com as diferenças e com as dissonâncias do senso e convivência comum. Inclusive a opção fora afugentar o diferente e proteger a sociedade.
A reestruturação do trabalho bancário, na década de 1990, marcada pela terceirização, precarização e intensificação do trabalho, tem mostrado consequências diretas na saúde dos trabalhadores. Diversas pesquisas discutem a relação entre as mudanças na organização do trabalho nessa época e a saúde dos profissionais do ramo financeiro.
Os sindicatos se deparam com essa problemática, uma vez que muitos trabalhadores buscam auxílio sindical no momento do afastamento ou adoecimento. Mas nem sempre os sindicatos dão conta de auxiliar essas pessoas no que tange ao acompanhamento dessas questões.
Edith Seligmann-Silva, médica, psiquiatra, pesquisadora do campo da saúde mental e do trabalho dialoga com a Psicopatologia do Trabalho de Christophe Dejours, e se propõe a compreender o sofrimento psíquico como parte do processo multideterminado, social e historicamente localizado, contrapondo-se à lógica de culpabilização dos indivíduos pelo seu processo de adoecimento.
A concepção de saúde que sustenta a postulação é marcada pela desconstrução da noção de saúde como algo estanque e pela afirmação dela como processo, com papel ativo do sujeito capaz de pensar e agir sobre.
Seligmann-Silva compreende que para a relação entre saúde e trabalho é necessário levar em consideração diversos aspectos individuais, macro e microssociais, que ela divide em patamares ancorados na divisão sexual do trabalho, em aspectos econômicos e sociais que influenciam a organização do trabalho, na cultura interna e políticas de gestão das empresas e na organização do trabalho e, por fim, no individual, que considera a história de vida, trabalho, relações pessoais e demais características individuais do trabalhador.
Seligmann-Silva aponta também dimensões características da precarização das relações de trabalho, que incide de modo marcante na saúde mental, que é indissociável da saúde como um todo. Entre as quais trata-se da fragilização – orgânica, existencial e identitária – dos indivíduos pela organização do trabalho com a intensificação da multiexposição.
Nesse contexto, aderente aos vínculos de trabalho e relações contratuais, que compreendem o processo sociopolítico de perdas de direitos trabalhistas ou de seu usufruto no mundo do trabalho real. Somado a isso, a organização de condições de trabalho que, em todos os setores de atividades, têm se caracterizado por metas inalcançáveis e pelo ritmo intenso de trabalho favorecidos pelo patamar tecnológico da microeletrônica.
Nessa esteira, Robert Castel, sociólogo francês, no seu livro “As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário”, chega a afirmar que a precarização é um processo multidimensional que altera a vida dentro e fora do trabalho.
A prevenção ao adoecimento no trabalho seria melhor elaborada por meio de uma combinação de: mudança organizacional visando reduzir o estresse no trabalho; desestigmatização das doenças mentais, incluindo cuidados com a saúde da população, com ênfase na saúde mental; reconhecimento e detecção precoce de problemas mentais e dificuldades emocionais; e intervenção apropriada e tratamento/programas para a saúde do trabalhador ligados ao sistema de saúde da comunidade.
Assim, a demanda de cuidado em saúde mental não se restringe apenas a minimizar riscos de internação ou controlar sintomas. Atualmente, o cuidado envolve também questões pessoais, sociais, emocionais e financeiras, relacionadas à convivência com o adoecimento mental.
Edson W. Tavares, Secretário de Saúde, Condições de Trabalho e Política Social do SEEB/RO