Dois netos para criar e um coração cheio de saudades misturado a outro sentimento: o de justiça. Assim tem sido os dias de Rejane de Castro, desde que a filha dela, Tereza de Castro morreu aos 23 anos, em janeiro deste ano, vítima de violência obstétrica segundo a família da jovem no Hospital Materno Infantil (HMI) em Marabá, sudeste paraense.
Além do amor dos netos, é na rede de apoio e solidariedade que Rejane encontra forças para seguir a luta em busca de justiça pela morte da filha e que na última segunda-feira (27) ganhou um novo capítulo. A dor dela foi ouvida pela Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa do Pará durante reunião do Grupo de Trabalho que juntou grupos de mulheres e representantes do Governo do Estado para estudo das leis de amparo às gestantes no Pará.
“Infelizmente, a violência obstétrica ainda não é crime em si porque não existe no código penal ou em lei especial que a tipifique, mas nós mulheres da Articulação Feminista de Marabá, da qual faço parte, estamos mobilizadas em várias frentes em busca de políticas públicas efetivas, com sugestões de projetos de lei de combate a esse tipo de agressão que deixam não somente marcas físicas, mas psicológicas também que afetam toda uma família”, destaca Heidiany Moreno, que também é diretora do Sindicato dos Bancários do Pará.
Em 2020, em Marabá, onde a dirigente mora, e no mesmo hospital onde Tereza foi vítima de violência obstétrica, o HMI; Heidiany teve a mesma dor de Tereza; e a angústia virou luta e dissertação de mestrado.
“Eu sofri violência obstétrica no meu segundo parto e na dissertação eu explico que eu conheci o termo, seu significado e consequências no Sindicato, em 2015, numa palestra que teve. Em 2016 eu tive o Hugo num parto humanizado em Belém, porém todo particular, aí quando fui ter a segunda filha, em 2020, aqui em Marabá, onde optei em ter, cheguei no hospital com 8 cm e sofri violência; e acabei me deparando com histórias muito, muito fortes de violência. Eu fiz um questionário com 20 mulheres, mas escolhi 3 relatos para utilizar na dissertação que foi de uma mãe que teve uma bebê com paralisa cerebral, uma mãe que perdeu um bebê de 9 meses; e outra que só conseguiu salvar o bebê, porque fez uma cesariana obrigada pela justiça, porque o hospital não queria fazer”, lembra a dirigente sindical.
Parte da dissertação da diretora do Sindicato consta no manifesto-denúncia sobre os casos de violência obstétrica em Marabá. O documento foi elaborado em 2022 pelo grupo Articulação Feminista e descreve, em quatro partes, a legislação de amparo às gestantes, os tipos de violência obstétrica, os casos de violações em Marabá, os relatos de famílias vitimizadas e recomendações de melhorias no sistema de saúde do município.
Em todo o Pará, segundo levantamento feito pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado (Segup), no período de 15 meses, ou seja, nos 12 meses de 2023 e mais os três primeiros meses de 2024, o estado registrou 46 casos e 27 óbitos relacionados à violencia obstétrica.
“A instalação do GT sobre violência obstétrica é um marco de extrema importância na nossa luta, às vésperas do Dia Nacional de Luta pela Redução da Mortalidade Materna. Uma de nossas sugestões foi a criação de um protocolo de atendimento tanto no Ministério Público, como na Polícia Civil, para que fosse feita uma fiscalização em relação ao cumprimento ou não do protocolo da rede Cegonha pelos hospitais e maternidades”, explica Heidiany Moreno.
A Rede Cegonha é um programa do Sistema Único de Saúde (SUS) e propõe a melhoria do atendimento às mulheres durante a gravidez, o parto e o pós-parto, também ao recém-nascido e às crianças com até dois anos de idade, oferecendo maior disponibilidade de atendimento no pré-natal, garantia de realização de todos os exames necessários, inclusive um exame de ultrassonografia, encaminhamento para atendimento se houver alguma complicação durante a gravidez e vinculação da gestante à maternidade de referência para o parto.
– Lei nº 9.016/2020 – Dispõe sobre a garantia à gestante da possibilidade de optar pelo parto cesariano, a partir da trigésima nona semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal;
– Lei nº 9.666/2019 – Dispõe sobre a Instituir a Semana Estadual do Combate à violência obstétrica no Estado do Pará;
– Lei nº 9.786/2023 – Institui a Semana do Combate à Mortalidade Materna no Estado do Pará;
– Lei nº 10.495/2024 – Dispõe sobre a obrigatoriedade de maternidades e estabelecimentos hospitalares que atendam gestantes, públicos ou privados, afixarem, nas áreas comuns e de circulação de gestantes e puérperas, cartazes e/ou placas para a publicização dos canais oficiais que recebam denúncias de violência obstétrica, no âmbito do Estado do Pará.
– PL nº 397/2019 – Dispõe sobre a garantia do direito da mulher a um acompanhamento durante todo o período de permanência no estabelecimento de saúde, nos casos de abortamento.
– PL nº 355/2019 – Dispõe sobre a prevenção da violência obstétrica no âmbito da assistência perinatal e dá outras providências.
– PL nº 360/2022 – Institui a Política Estadual de Prevenção à violência obstétrica no Estado do Pará e dá outras providências.
– PL nº 65/2023 – Dispõe sobre medidas de proteção, conscientização, prevenção e combate à violência obstétrica no Estado do Pará e dá outras providências.
– PL nº 66/2023 – Institui a Política Estadual de atenção e prevenção à violência obstétrica no Estado do Pará.
– PL nº 284/2023 – Dispõe sobre o Dia Estadual de Prevenção e Combate à Violência Obstétrica e dá outras providências.
– Projeto de Indicação nº 04/2017 – Dispõe sobre a implantação de medidas que possibilitem o acesso a informações a gestantes ou parturiente, referente a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, visando, em especial, a proteção destas contra a violência obstétrica nos estabelecimentos de saúde do Estado do Pará e o direito à atenção obstétrica humanizada.
Em caso de violência, exija a cópia do seu prontuário à instituição que foi atendida, esse prontuário é um documento que pertence ao paciente e só podem ser cobrados por custo de cópia; e denuncie, o Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher é um dos canais que recebe esse tipo de denúncia.
Fonte: Bancários PA com Alepa e agências de notícias