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19 de Julho de 2021 às 08:56

Desastre anunciado: projeto de lei obriga segurado a pagar perícia médica


Por: Priscila Arraes Reino

Um Projeto de Lei extremamente danoso aos segurados incapacitados que não conseguiram comprovar essa condição junto ao INSS, e só obtém a reparação da falha cometida após acionar a Justiça Federal, foi aprovado na última quarta-feira, 14 de julho, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara Federal.

O PL 3.914/2020 atribui aos segurados que vierem a se opor à negativa de perícia do INSS na justiça, o pagamento antecipado dos honorários do perito médico que o avaliará na Justiça Federal.

Ficarão de fora desta exigência, somente os segurados que comprovarem ter renda familiar per capita inferior a ½ salário mínimo ou renda familiar inferior a 3 (três) salários mínimos e tiverem obtido assistência judiciária gratuita.

Quando se fala em injustiça, ela é validada em números do próprio INSS. Sabemos que hoje, em média, 50% dos segurados que procuram a justiça para serem reavaliados, ganharam seus processos e recebem seus benefícios.

Esse índice de reversão na justiça é muito alto, e nos permite dizer que o processo administrativo de concessão de benefício por incapacidade é ineficiente. Portanto, é essa ineficiência que deveria ser combatida.

O PL 3.914/2020 é inconstitucional, além de imoral, já que transfere o ônus que sempre foi do Poder Judiciário, ao segurado, e dificulta, senão impede o acesso do segurado incapaz, ao judiciário.

É imoral ainda, pois o INSS é responsabilidade do Poder Executivo, portanto deveria ele se preocupar em melhorar os serviços prestados pela autarquia, de maneira a diminuir e não aumentar o número de processos que acabam desembocando na Justiça Federal!

Então se pune a vítima do serviço prestado pelo INSS e não o responsável pelos serviços que hoje estão sendo prestados precariamente? E a punição ao segurado é sua fome, seu desemprego, é o seu despejo por falta de pagamento do seu aluguel.

Não estou exagerando, e vou mostrar o porquê.

O PL vai além do que já foi dito aqui. Mas, para entender como, vamos ter que voltar um pouco e demonstrar como isso funciona.

Para receber o seu benefício por incapacidade temporária, ou em caso de incapacidade permanente, a aposentadoria por incapacidade permanente, hoje o segurado incapacitado precisa agendar uma perícia junto ao INSS e demonstrar ao perito médico, sua incapacidade para as atividades habituais.

Caso o INSS negue seu benefício, não reconhecendo a sua incapacidade para o trabalho, o segurado não costuma buscar o conselho de recursos. Este, que funciona como instância superior no tocante às decisões proferidas pelo INSS, não realiza perícias médicas para reavaliar os segurados, e portanto não é acionado pelos segurados quando a negativa versa sobre matéria médica.

Nesses casos o segurado costuma então procurar o judiciário, onde será reavaliado por médicos peritos judiciais, e terá a chance de 50% de obter o ganho de seu direito. Esta é a estatística atual de possibilidades de êxito.

Mas se o Projeto de Lei for aprovado como saiu da CCJC, os segurados que alegam incapacidade e tiveram seus benefícios negados no INSS serão obrigados a recorrer ao conselho de recursos, o que hoje significa a espera de dois anos em média, para um resultado.

A espera é cara não só ao segurado incapacitado, que impedido de trabalhar e sem benefício concedido, não terá como arcar com o seu sustento e o de sua família. Ficará cara ao INSS e à União, já que aumentará o número de meses recebidos em atraso pelo segurado, caso consiga ultrapassar todas as dificuldades.

Quanto à inconstitucionalidade das medidas propostas, pode-se apontar a afronta ao direito de acesso à justiça. Direito fundamental de todo e qualquer cidadão brasileiro.

E para finalizar, questões econômicas têm justificado inúmeros avanços contra direitos fundamentais dos cidadãos, e esta não é nem a primeira, nem será a última vez.

No entanto, é uma afronta à inteligência de qualquer pessoa dizer que a perícia médica judicial, que representa em torno de 3% do custo de um processo como este, é problema a ser resolvido dessa maneira: simplesmente acabando com a possibilidade de o segurado ser reavaliado judicialmente à custa da fome e do desamparo.

*Priscila Arraes Reino, advogada especialista em direito previdenciário e direito trabalhista. Palestrante e sócia do escritório Arraes e Centeno Advocacia

Fonte: Estadão

Foto Fachada: Tomaz Silva/Agência Brasil


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