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30 de Abril de 2015 às 12:39

30/04/2015 - Especialistas aprovam pesquisa do SEEB/Brasília sobre saúde do bancário




Brasília - Em audiência pública na Câmara dos Deputados, o Sindicato lançou, na terça-feira (28), a cartilha ‘100% não é mais o limite: Riscos Psicossociais do Trabalho Bancário’, que resume dados apresentados pela pesquisa com mesmo nome. O estudo foi elaborado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Saúde do Trabalhador e o Laboratório de Psicodinâmica e Clínica do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB).

A maioria dos integrantes da mesa corroborou o resultado da pesquisa e salientou que o setor bancário pode estar sofrendo de uma epidemia relacionada notadamente à saúde mental e que é preciso tomar providências urgentes para efetivar medidas preventivas.

Segundo o presidente do Sindicato, Eduardo Araújo, a prevenção é o foco da entidade ao elaborar e publicar o material sobre o tema e solicitar à Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados uma discussão ampla sobre o assunto. “Por meio da Clínica do Trabalho, o Sindicato acolhe e ajuda aqueles que nos procura por conta dos adoecimentos. Agora queremos discutir medidas preventivas. Se há um risco de epidemia no sistema, como apontam os especialistas na área, precisamos trabalhar com cuidado. Estamos lidando com a vida humana”, ressaltou.

Para a psicóloga e coordenadora acadêmica da Universidade de Brasília (UnB), Ana Magnólia Mendes, responsável pela pesquisa, o estudo mostrou que a gestão gerencialista é o estilo que mais causa riscos ao trabalhador, devido ao alto controle do trabalho vinculado às estratégias de qualidade total.

“Isso desenvolve na categoria danos psicológicos e transtornos mentais. Estamos à beira de uma barbárie social e precisamos frear esta condição. O problema pode estar na forma de gestão das metas e na pressão exercida para que se cumpra o que foi imposto. Muitas vezes, a meta é humanamente inatingível. Mas, diferentemente da natureza do trabalho, é possível mudar o estilo de gestão. Por isso, é inaceitável dizer que não há saída”, destacou.

O que pensa a Fenaban

Psicóloga e representante da Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), Débora Raab Glina questionou os dados apresentados na pesquisa. Mas, mesmo assim, afirmou que as possíveis falhas não interferem nos resultados do estudo, reconhecendo-o como sólido e bem amarrado. “Os problemas levantados no meu parecer não inviabilizam ou tiram o mérito da pesquisa e de suas conclusões”, analisou.

Já o diretor de Relações do Trabalho da Federação Nacional dos Bancos (Fenaban), Magnus Apostólico, reclamou da realização da audiência pública e da pesquisa, publicada em 2014, sem uma consultada prévia à Fenaban. “O que o Sindicato quer aqui se existem outros espaços de discussão. Isso deve ser levado à mesa de negociação”, provocou.

Magnus disse que não vê sentido no descontentamento da categoria bancária, pois é a que possui os maiores benefícios com relação a outros setores no país e que, portanto, não deveria haver reclamação. “Com a maior permanência média no emprego, já que as pessoas permanecem por mais de 13 anos no mesmo emprego, não podemos aceitar essa insatisfação elevada.”

‘Bancário não é apêndice de máquina’



Bancária da Caixa e ex-presidenta do Sindicato e da CUT Brasília, a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), que convocou e presidiu a audiência, respondeu veementemente à provocação da entidade do sistema financeiro. “É dever deste Parlamento e, particularmente, da Comissão do Trabalho, discutir as relações de trabalho. Não precisamos de autorização da Fenaban para isso. Mas perdoamos essa agressão ao Parlamento ao nos questionar sobre a realização desta audiᆰncia pública”.

Na opinião de Erika, o resultado da pesquisa ᄅ extremamente grave. “A bancária e o bancário não são apêndices de máquina ou objeto de planilha de custo. São pessoas e, como tais, querem que o ambiente de trabalho expresse essa humanidade. O que se vê é nessa administração por estresse e de pressão para que se atinjam metas sempre impostas é captura dos sonhos nas relações de trabalho, refletida no adoecimento organizacional”, afirmou a parlamentar.

A deputada firmou o compromisso de solicitar à Comissão de Trabalho a realização de um seminário para aprofundar a discussão da saúde do trabalhador bancário, especialmente, do assédio moral. “As falas de hoje apontam para uma doença no ambiente de trabalho da categoria bancária. É preciso enfrentar essa situação e lutar para desnaturalizar o sofrimento do bancário, que passou a ser também um vendedor”, sentenciou.

‘Sempre disputamos o poder das versões’



Na opinião do presidente do Sindicato, a manifestação do diretor da Fenaban não traz nenhuma surpresa. “Sempre disputamos o poder da palavra e das versões. Não seria diferente nesta audiência. A Fenaban não tem moral para dizer o que podemos ou não discutir e ela também não define qual o fórum ideal para se discutir a agenda da saúde. O assunto está na pauta de negociação sim, mas os bancos não sabem nem quantas pessoas estão de licença saúde, tamanho o descaso. Por outro lado, a Fenaban não consulta os representantes da categoria bancária quando querem reestruturar as normas para os empregados das instituições financeira”, enfatizou.

O presidente da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Centro Norte (Fetec-CUT/CN), José Avelino, concordou com Araújo e reforçou que ‘a mesa de negociação não avança na discussão sobre saúde, ao contrário do que foi colocado pelo representante da Fenaban. Tentaram, ainda, descaracterizar a pesquisa, mas ela apresenta dados reais’. “Como negar a veracidade de um fato, quando ele é relatado e confirmado por vários especialista. A verdade apresentada aqui nesta audiência é inquestionável”, destacou o secretário de Saúde e Condições de Trabalho do Sindicato, Wadson Boaventura.

Trabalho não é mercadoria

“Trabalho não ᄅ mercadoria, pois há pessoas envolvidas e que precisam, efetivamente, ter autonomia e voz para conseguir se realizar na atividade em que atua”, afirmou a procuradora Regional do Trabalho do Ministério Público do Trabalho Adriane Reis de Araújo, propondo uma reflexão sobre o que realmente significa trabalho.

Segundo Adriane, a aceleração do ritmo do trabalho e a consequente sobrecarga dos trabalhadores atualmente se devem às novas tecnologias. “Hoje, os trabalhadores atuam à distância por meio do celular, tablete, computador e, por esses mesmos meios, são vigiados e controlados pelo empregador.”

A esse problema, a procuradora acrescenta a transferência do risco econômico, com imposição de metas, e da segurança pública da empresa para o trabalhador. “Esse quadro traz um número acentuado de adoecimento e de medicalização. Talvez, a pesquisa seja um retrato ameno da situação que pode estar muito mais grave”, analisou.

Saúde mental: problema de saúde pública

O coordenador-geral de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, Jorge Machado, disse que os números da pesquisa são calamitosos. “É uma denúncia de saúde pública. É a ponta de um iceberg onde há um adoecimento mental, que a gente tem que enfrentar”, ressaltou.

Nesse sentido, Mesquita se comprometeu a propor a incorporação do assunto numa política de atenção ao trabalhador dentro do Ministério da Saúde. "A gestão participativa para reorganizar o trabalho tem que ser construída num processo de intervenção que deve ser intersetorial."

“A audiência de hoje pode possibilitar a construção de um programa de vigilância da saúde do trabalhador, pois a categoria bancária está perdendo qualidade de vida. O trabalhador tem medo de perder emprego, pois a relação com a família e com a sociedade passa pelas relações de emprego. Não dá pra falar só das vantagens com relação aos outros setores. Aqui se tem uma situação de crise dos trabalhadores que não representa uma crise do setor financeiro. Pelo contrário, não há crise nesse setor”, afirmou Machado.

Assédio moral: caráter organizacional



“Falta aos bancos fazer uma mea-culpa sobre a forma irresponsável com que tratam a saúde dos trabalhadores. Estamos falando de um setor que tem lucros cada vez maiores, em detrimento da saúde do trabalhador. As metas, ao contrário do que foi alegado pelo representante da Fenaban, são individuais e não coletivas, e não levam em conta a qualidade no atendimento, o que é um absurdo”, opinou a auditora fiscal do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego Luciana Veloso.

A auditora apresentou dados de uma fiscalização realizada em São Paulo em 2014, a qual apontou para a disseminação da prática de assédio moral organizacional no banco. “As provas mostram o caráter organizacional do assédio praticado pelo banco, a partir do uso de mensagens de texto enviadas ao seu celular pessoal do bancário, com rankings comparando a produção individual. Esses procedimentos são proibidos pela convenção coletiva de trabalho, tão invocada pelo representante da Fenaban, mas que não é cumprida”, destacou.

“A questão do adoecimento mental nesse banco e em outros é patente e se agrava a cada dia. A pesquisa do Sindicato encontra eco no que vi falei aqui. É exatamente a realidade que vejo, enquanto auditora fiscal, quando fiscalizo as agências e converso com os empregados. O assédio moral organizacional tem caráter sistêmico e patológico. Acontece em todos os bancos brasileiros e em nível gravíssimo”, apontou Luciana, autora do livro ‘Riscos Psicossociais e Saúde Mental do Trabalhadorル.

Rosane Alves
Do Seeb Brasília

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