Parlamentar afirma que proposta é apresentada "num contexto de reacionarismo na Câmara e como contraponto progressista à pauta conservadora no Congresso"
por Eduardo Maretti, da RBA
São Paulo – O deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) apresentou hoje (26) o Projeto de Lei 2.769/2015, com a proposta de revogar a Lei de Segurança Nacional, nº 7.170, de 14 de setembro de 1983. “Passados 27 anos da promulgação da Constituição da República de 1988 e 36 anos da Lei de Anistia, não se realizou uma reforma legislativa para suprimir leis e dispositivos que compõem o chamado entulho autoritário”, diz o parlamentar na justificativa da proposta.
À RBA, Damous afirmou que vai convidar outros deputados que têm o mesmo pensamento em relação ao tema, para subscreverem o projeto. “Vamos tentar convencer os colegas para que esse entulho autoritário seja revogado. É remanescente da ditadura e não tem por que continuar em vigor.”
Ele disse também que o atual ambiente de intolerância no país, com manifestações de setores da sociedade que, embora minoritários, pedem o golpe e a volta da ditadura, inspirou a iniciativa. “Não tenha dúvida. E este projeto também é apresentado num contexto de reacionarismo aqui da Câmara, de atentado ao processo civilizatório, da pauta conservadora. É um contraponto progressista à pauta conservadora no Congresso.”
Na justificativa do projeto, Damous faz uma analogia com a Alemanha do pós-guerra, que implementou uma “ampla reforma legal para retirar dispositivos punitivos que serviram de base para a sustentação política do regime nazista”. Já o Brasil ainda convive com instrumentos legais que serviram ao regime de exceção, politicamente extinto em 1985.
“Baseados na concepção da teoria da defesa social (...) os dispositivos que ora se pretende revogar possibilitaram a repressão, tortura e morte de inimigos políticos”, justifica ainda. “Ações penais instauradas em desfavor de integrantes de movimentos sociais tiveram por base a Lei de Segurança Nacional, mesmo os tribunais superiores tendo consolidado farta jurisprudência no sentido de que a atuação desses movimentos é um exercício de cidadania, própria do Estado democrático de direito”, acrescenta.
Um outro projeto, o PL 7951/2014, apresentado pelos deputados Renato Simões (PT-SP), Erika Kokay (PT-DF) e outros foi apresentado em 2014, arquivado e desarquivado em março deste ano, mas sua tramitação está parada. A proposta do ano passado é mais complexa juridicamente por pretender a anulação de condenações, ações penais e inquéritos policiais contra lideranças dos movimentos sociais e sindicais por participação em atos como greves e ocupações de fábricas.
O projeto prevê também o fim do crime de desacato, previsto no Código Penal e no Código Penal Militar. Damous usa como exemplo de abuso do poder policial, justificado pelo desacato, o episódio ocorrido com o artista Leônides Quadra, em Cascavel (PR). Interpretando um palhaço, ele foi preso brutalmente pela Polícia Militar do governo Beto Richa (PSDB) ao se apresentar em praça pública e criticar o governo. A detenção do palhaço provocou revolta na população que testemunhou a cena.
“Usamos isso como exemplo porque é um fato recente. Mas ao longo dos anos, das décadas, isso tem se sucedido. Qualquer advogado em audiência, quando enfrenta um juiz, pode ser preso por desacato. Um advogado que é maltratado pelo serventuário e resolve enfrentar o funcionário, muitas vezes é processado. O desacato é um dispositivo autoritário”, diz.
Segundo Damous, a Declaração de Princípios sobre a Liberdade de Expressão, aprovada no âmbito da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, prevê que “as leis que punem a expressão ofensiva contra funcionários públicos, geralmente conhecidas como ‘leis de desacato‘, atentam contra a liberdade de expressão e o direito à informação”.