Uma empregada da Caixa Econômica Federal que, em 2019, de forma prematura, deu a luz a uma filha que precisou ficar internada os nove primeiros meses de vida em UTI neonatal, conquistou uma vitória na Justiça do Trabalho que vai permitir que ela continue trabalhando em casa e, ao mesmo tempo, cuidar da filha, que tem paralisia cerebral e precisa de cuidados especiais e atenção permanente.
Foi o que decidiu, nesta quinta-feira (3/2), o Juiz do Trabalho Alexandre Moreira dos Santos Almeida, substituto na 4ª Vara do Trabalho de Porto Velho (TRT 14), em análise da ação ajuizada pelo Sindicato dos Bancários e Trabalhadores do Ramo Financeiro de Rondônia (SEEB-RO), que na qualidade de substituto processual, requereu a manutenção do trabalho remoto (home office) à bancária, que já vinha desempenhando suas atividades nesse regime desde o início da pandemia, principalmente por ela “coabitar com pessoas classificadas no grupo de risco para o covid-19”.
ENTENDA
Em julho de 2019, a trabalhadora deu à luz a sua filha que, em decorrência do nascimento prematuro, foi diagnosticada com hemorragia intracraniana e hidrocefalia, além de ter sofrido paradas cardiorrespiratórias, e por isso necessitou ficar internada os nove primeiros meses de vida em UTI neonatal. Com a evolução da saúde, a recém-nascida foi liberada para receber os cuidados paliativos em casa, já diagnosticada com paralisia cerebral, atualmente denominada “encefalopatia crônica não evolutiva”.
E por conta dessa enfermidade a criança teve que passar por diversos procedimentos invasivos, além de ser dependente de respirador mecânico.
Quando a criança recebeu alta hospitalar já havia sido declarada a pandemia do novo coronavírus no planeta, e como forma de garantir a saúde e a segurança dos trabalhadores do ramo financeiro, foi assegurada a modalidade de teletrabalho (home office), principalmente às pessoas que se enquadravam no chamado “grupo de risco”.
Contudo, em 28 de janeiro de 2021, a bancária foi convocada a retomar suas atividades presenciais na agência, medida que põe em risco a saúde sua e de sua filha.
“Mesmo com a ampla adesão à vacinação, com aproximadamente 80% da população com pelo
menos uma dose, ainda assim a covid continua se disseminando enormemente e ceifando a vida de diversos brasileiros. Assim como aconteceu em meados do final do ano de 2020, no final do ano de 2021 houve significativa redução na quantidade de casos diagnosticados e mortes. No entanto, novamente o vírus se propagou de forma alarmante em razão da variante Ômicrom. Em dezembro o Brasil registrou o menor número de mortes por Covid-19 desde março de 2020. No entanto, em menos de um mês, em janeiro de 2022, o país vem batendo recorde do número de infectados e beirando mil mortos por dia”, descreve o magistrado, em sua sentença.
“O direito à saúde e à vida compõe o rol de direitos fundamentais insculpidos na Constituição Federal de 1988, de modo que preferencialmente deverão ser resguardados. Além disso, conforme artigo 227 da Constituição Federal, é dever da família e da sociedade assegurar à criança o direito à vida, à saúde, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência”, continuou o juiz.
A manutenção do home office objetiva, sobretudo, assistir a criança nos cuidados de saúde necessários, bem como evitar a contaminação da trabalhadora – que possui a comorbidade de hipertensão – e sua filha – que é acometida por inúmeras doenças e até mesmo necessita de aparelho mecânico para auxiliar na respiração.
“Por todo o exposto, tendo em conta as incertezas deste vírus que abala todo o mundo, bem como por não haver comprovação de que a concessão de teletrabalho aos trabalhadores que possuam comorbidade ou residam com quem a possua está prejudicando consideravelmente a prestação de serviços e sua atividade econômica, em atenção aos direitos fundamentais à vida e à saúde, presentes o risco de dano e a probabilidade do direito, defiro o pedido da autora para manter o regime de trabalho remoto (home office) à substituída até o encerramento da pandemia de covid-19, sob pena de aplicação de multa diária de R$ 5.000,00, até o limite de R$ 100.000,00”, concluiu o magistrado.
A ação foi conduzida pelas advogadas Thays Pinheiro e Raisa Luna de Lima, do Escritório Fonseca & Assis Advogados Associados, que presta assessoria jurídica ao Sindicato dos Bancários e Trabalhadores do Ramo Financeiro (SEEB-RO).
Processo 0000060-77.2022.5.14.0004