“Um golpe não é uma hipótese disponível aos devaneios do presidente Jair Bolsonaro”, que está num momento de desespero, afirma o presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre em artigo sobre o golpe de 1964, que implantou a ditadura militar no Brasil, e os fatos que abalaram as estruturas de Brasília esta semana.
Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa, general da reserva Fernando Azevedo, e os comandantes do Exército, general Edson Pujol, da Marinha, almirante Ilques Barbosa Júnior, e da Aeronáutica, brigadeiro Antonio Carlos Moretti Bermudez, entregaram os cargos e, na mesma hora, foram informados pelo novo ministro da Defesa, Walter Braga Netto, que haviam sido dispensados pelo presidente. Tudo isso, na semana em que os militares comemoram o golpe que eles chamam de revolução.
Esta quarta-feira, 31 de março, marca os 57 anos do golpe de 1964, que deu início à ditadura militar que perdurou por 21 anos de assassinatos, tortura, desaparecimentos.
Leia a íntegra do artigo de Sérgio Nobre,presidente da CUT
O aniversário de golpe de 1964 e a recente reforma ministerial de Bolsonaro, que se cerca de militares mais convenientes aos seus desatinos, levam setores da mídia e até da sociedade a uma certa preocupação com um possível arroubo autoritário do presidente da República.
Tenho certeza de que seria uma saída muito ao gosto do presidente, mas não vejo nenhuma possibilidade de as Forças Armadas embarcarem em uma aventura autoritária.
Bolsonaro caminha para um fracasso retumbante e, por isso, se vale de soluções radicais para salvar, minimamente, a sua já medíocre biografia. Qualquer governante um pouco mais lúcido perceberia que não há saída para o Brasil sem, primeiro, dar solução para a pandemia, como condição para, na sequência, enfrentar o desemprego e retomar o crescimento econômico.
O presidente, porém, prefere criar seus fantasmas e governar tentando enfrentá-los. Sem critérios, encheu o governo de militares, que comandam seis ministérios, e, continuamente, tenta convencer os generais que existem inimigos internos e outras conspirações a serem enfrentadas.
Com esse comportamento e retórica, o presidente tenta esconder o fracasso de sua política econômica, que é pilotada por um ministro ultraliberal, querido dos mercados, que prometeu crescimento e modernidade aos empresários, reformou, privatizou, mas cujo “projeto econômico” não resistiu ao primeiro confronto com a realidade.
O resultado é desastroso: o brasileiro hoje é mais pobre do que na década passada, o Brasil enfrenta recessão, recorde de desemprego, desindustrialização, fuga de investimentos e o retrocesso do aumento da pobreza extrema e da miséria, que haviam sido superados.
Um golpe não é uma hipótese disponível aos devaneios do presidente.- Sérgio Nobre
Fracassado na política econômica e no enfrentamento à pandemia, Bolsonaro assiste seu apoio eleitoral ruir, o que o afasta, cada vez mais, dos votos que obteve em 2018 e o leva ao desespero.
Com o desespero, surge a retórica da necessidade de centralizar o poder nas mãos do presidente e da relativização da democracia. Desesperado, Bolsonaro acredita e tenta fazer acreditar que os militares serão fiadores dessa retórica e da sua incompetência, além de garantidores de seu desgoverno.
Isso não acontecerá, porque não há comparação possível entre as instituições que regiam o nosso país em 1964 e as que funcionam agora; elas amadureceram e hoje compõem nossa democracia, incluindo aí as Forças Armadas.
Bolsonaro e seu entorno precisam entender que valores como democracia, direitos humanos e meio ambiente são ativos da sociedade brasileira, dotados de valores sociais, culturais e, inclusive, econômicos. As tentativas de seu governo de romper com esses valores têm provocado sérias divisões em nosso país e custado caro ao Brasil na sociedade das nações.
O golpe de 1964, a ruptura democrática e as vidas tiradas e torturadas são fatos que devemos conhecer e lamentar, jamais esquecer, para que se faça justiça e nunca se repitam. Mas tenho certeza de que um golpe não é uma hipótese disponível aos devaneios do presidente.