Kleytton Moraes
Na Revista Fórum
Num Brasil de 2023 imerso num mundo caduco e insustentável é mais do que urgente “parirmos” outras possibilidades, permitindo a máxima de que “toda realidade está grávida do seu contrário”.
A tragédia que se abateu sobre o Brasil, contra e diretamente sentida e sofrida pela classe trabalhadora, é assombrosa.
Se à consolidação de direitos tão fundamentais à condição humana é preciso anos e anos de luta, o ímpeto dos títeres, genocidas e depravados ao seu desmonte e destruição não precisa mais do que alguns poucos anos.
Da precarização total das condições de trabalho ao desemprego estrutural, ressurgem milhares de pessoas em situação de rua e milhões em insegurança alimentar, o que fez retor o Brasil ao mapa da fome.
Desmantelo total do estado, bombardeio e contrainformação por meio de redes criminosas de propagação de mentiras fizeram o Brasil retroceder e, sem cerimônia ou protocolo, assumem de maneira ainda mais vil e mesquinha o assombro de suas mentes coloniais.
Quase 135 anos após a abolição da escravatura no Brasil, situações análogas ao trabalho escravo lamentavelmente ainda são registradas no país.
Episódios como os do Rio Grande do Sul, registrados em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, no qual 207 trabalhadores, em sua maior parte oriundos da Bahia, trabalhavam na colheita da uva para as empresas Aurora, Salton e Garibaldi, submetidos a situações degradantes e análogas ao trabalho escravo como constata as investigações preliminares conduzidas pela operação conjunta da Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal e ministério do Trabalho e Emprego, ao se tornarem públicas posto que retornam se as fiscalizações e autuações dos fiscais e agentes do trabalho, escancaram os níveis lamentáveis de retrocesso que os tempos de atentados a democracia nos impôs.
Nas operações constatam-se as condições submetidas aos trabalhadores com jornadas exaustivas, recebendo comida imprópria para consumo, até a imposição de comprar produtos em um único estabelecimento, com desconto salarial e preços elevados, e eram mantidos vinculados ao trabalho por supostas "dívidas" contraídas com o empregador
O aumento da tensão no campo estourou no Brasil. Número de homicídios disparam, sobretudo, incentivados pela impunidade e pela apologia da violência estimulada no último e trágico período.
Esta duríssima e lamentável realidade encontra-se registrada no relatório de Conflitos no Campo Brasil 2021, divulgado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). O documento, de acordo com a entidade, é o retrato do pior cenário da série histórica desde 1985.
O relatório ainda aponta que as mortes ocorridas em decorrência dos conflitos aumentaram mais de 1.110%, no último período. Dentre as 109 morres registradas, a imensa maioria, 101, foram de indígenas Yanomami. Aparece também um aumento de 44% nos registros de pessoas torturadas e de 39% das agredidas fisicamente, em situações de conflitos rurais.
A CPT identifica que essa tragédia aprofunda-se com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), tendo desencadeado uma política reacionária e “antirreforma agrária, expropriatória e violenta nas áreas rurais” no país.
O fascismo e o rentismo inescrupuloso e sem modéstia continuam a produzir suas vítimas.
No último dia 11, na comunidade do Cupim, em Correntina (BA), a violência no campo fazia novas vítimas, quando se registrou o ataque de vários pistoleiros com armas de grosso calibre contra os fecheiros (trabalhadores que atuam e defendem a posse da terra na região denominada de Fecho, que é utilizada para a solta de gado).
A sabotagem praticada pelo Bacen ao insistir numa política monetária insensível à realidade do povo e alheia à geração de emprego, renda e controle inflacionário, torna empecilho para o projeto de crescimento inclusivo do país que foi escolhido nas urnas, em outubro de 2022.
A manutenção da taxa básica de juros da economia em 13,75%, além de afastar investimentos na produção retira do orçamento público mais de R$ 600 bilhões, que vão da mesa da população brasileira, habitação, saúde e educação engordar as contas do rentismo.
Com um Brasil cuja herança recebida pelo presidente Lula é de 33 milhões de cidadãos com fome e 15 milhões de desempregados, tornando o país o mais desigual do planeta no ranking das nações, a tarefa, mais do que nunca, é urgente e requer de todos consciência, unidade e todo esforço pra que possamos pressionar as estruturas e modificar a realidade.
É urgente disciplinar a sanha inconsequente do rentismo. Libertar o estado das armadilhas impostas que inacreditavelmente impuseram um teto de gastos às necessidades do povo, mas, no arrepio da desgraça do povo, tem o céu como limite para pagamento dos juros.
Não podemos tolerar a lógica de adoecimento, que é implacável pelos seus métodos de produção de resultados, utilizando dos assédios e metas desumanas, fazendo adoecer e assassinando bancárias e bancários todos os dias.
Nossos esforços serão incansáveis para a reconstrução da dignidade da nossa gente. Buscaremos políticas públicas que respeitem e devolvam o respeito a pessoa humana, ao meio ambiente, à cultura, aos direitos e à vida.
Indígenas, quilombolas, assentados da reforma agrária, atingidos por barragens, cooperados e prestadores de serviços ambientais. As mulheres negras, como constatado pela fundamental Lélia Gonzales no seu conceito da interseccionalidade (“E a trabalhadora negra, cumé que fica?”) precisam e serão a urgência que o Brasil necessita cuidar, a fim de recuperemos nossa passagem para uma nova e possível realidade, por que esta, a impossível, já deu.
1 de maio de 2023: reflexão, memória, realidade e celebração. Trabalhadores na perspectiva artística do Santa-mariense Jurandir Assis
Numa homenagem aos que ajudaram e ajudam a (re)construir o Brasil, destaco algumas obras que retratam cenas e figuras de trabalhadores brasileiros em suas profissões.
Se é verdade que a arte imita a vida, também é sua capacidade de transformá-la.
Assim, um olhar apreciativo sobre as obras de arte é uma boa oportunidade.
Apresentamos algumas telas de Jurandi Assis, de quem tenho a honra de ser conterrâneo. Voa, Santa Maria da Vitória (Ba), e deixa mostrar, com orgulho, o valor de sua gente.
Nelas, além do deleite artístico da apreciação das belíssimas e sofisticadas obras, é possível estabelecer paralelos entre realidades vividas, mas hoje superadas pelas populações que habitam e fazem vida nos grotões do nosso Brasil profundo.
Jurandir é um artista que não consegue se impedir de mesclar o sonho à realidade, a ilusão à verdade, de confundir o material e o imaterial, de procurar, sob as aparências corporais as faculdades morais, intelectuais e sentimentais, do que o espírito humano é composto. De descobrir as misteriosas relações que se estabelecem entre os seres e as coisas.
Olhemo-nos e cuidemo-nos, companheirada!
Obra de Jurandi Assis
Obra de Jurandi Assis
Obra de Jurandi Assis
Obra de Jurandi Assis
*Kleytton Morais é presidente do sindicato dos bancários do DF, funcionário do Banco do Brasil, cientista político e músico.