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11 de Junho de 2021 às 09:37

Artigo de Zezé Furtado: Mulheres chilenas no protagonismo político do país


Zezé Furtado

A desigualdade social no chile sempre foi uma tônica naquele país. Na esperança de diminuir a desigualdade promover reformas estruturantes o povo elegeu, em 1970, o governo popular e progressista de Salvador Allende. Contudo, Allende não pôde terminar seu mandato e morreu lutando, no mesmo dia que se consolidou o golpe militar que trouxe para o governo o ditador General Augusto Pinochet.

Não diferente no Brasil a história do golpe militar e posterior ditadura militar em muito se parece com a chilena, ambos os países tiveram a eleição democrática de um presidente progressista e sofreram o golpe militar, orquestrado pelos Estados Unidos, o mercado financeiro internacional, as elites e as forças armadas desses países. Ditaduras essas que perduraram por décadas. Ambas foram extremamente violentas, com a prisão o sumiço, a tortura e a morte de várias pessoas. A ditadura chilena foi considerada pelos direitos humanos a mais violenta da história da América Latina.

A atual Constituição Chilena é a décima da história do Chile e foi imposta em 1980 por Pinochet. Vale ressaltar que todas as constituições chilenas foram escritas pelos chamados “grupos de notáveis”, que o Chile nunca teve uma Assembleia Constituinte e mais, mulheres nunca participaram da elaboração da Carta Magna do país.

Outra característica fundamental dessa constituição, ora vigente, é ser a mais neoliberal do mundo, pois sua elaboração é da época em o modelo de política econômica baseava-se na escola de Chicago.

Esse modelo neoliberal foi o principal alvo da revolta social iniciada em outubro de 2019. As manifestações de 2019 duraram cerca de um mês e levaram mais de 2 milhões de pessoas às ruas do Chile, diariamente. Houve repressão por parte do exército e até toque de recolher. Na intenção de paz os presidentes dos principais partidos daquele país decidiram firmar um acordo, o qual o previa a realização de um plebiscito constitucional, que aconteceu em outubro de 2020 e aprovou a convocação de uma Assembleia Constituinte e a realização de eleições diretas para a escolha de seus membros.

Importante lembrar que em 2018, houve atuação dos movimentos feminista e estudantil muito forte no Chile contra a violência de gênero e o assédio sexual. O debate ampliou e culminou, em 2020, na aprovação da lei que prevê a paridade de gênero nos assentos da assembleia constituinte e, também na representação dos povos originários na elaboração da nova constituição. Pela primeira vez, uma Constituição vai reconhecer a população originária no Chile. Dos 155 representantes, 17 lugares foram reservados à indígenas que compõem 12,8% da população chilena.

A inédita eleição paritária ocorreu no domingo (16/05) e será mais um passo na representação eleitoral do Chile, que entra para a história da América Latina e do mundo como o primeiro a garantir a paridade de gênero numa assembleia constituinte, consagrando um grito que ecoou nas ruas do país: “Nunca mais sem nós”.

“Para a cientista política chilena Pamela Figueroa, secretária de governo da ex-presidente chilena Michelle Bachelet, alcançar a igualdade de gênero demanda incidência dos movimentos sociais e políticas que promovam a igualdade de homens e mulheres nos espaços de poder. Mas não é só isso. “É preciso garantir a não discriminação das mulheres nos sistemas político, econômico e social”, disse a economista em entrevista ao site Universa no dia 26/04/2021.

Para evitar o predomínio masculino entre os constituintes, foi redigida a regra da paridade, contudo, surpreendentemente as mulheres foram eleitas em maior proporção: 81 contra 74. Algumas mulheres terão que abrir mão para que o critério de paridade seja cumprindo. Outra surpresa foi a vitória de candidatas e candidatos independentes. De acordo com o jornal chileno “La Tercera”, a maioria tem menos de 45 anos é de esquerda ou defendem pautas progressistas.

Além dos constituintes, chilenos votaram em prefeitos, vereadores e, pela primeira vez, governadores regionais. A prefeita eleita para a capital Santiago foi a economista Irací Hassler Jacob, do Partido Comunista Chileno.

Todo esse processo ocorrido recentemente no Chile nos dá esperança contra a ofensiva ultra-neoliberal que avança e se aprofunda na américa latina e nos mostra o poder que tem o povo na rua. Nos faz compreender que a falta de investimento nas políticas públicas, e em áreas como educação e saúde, afetadas pelo desmonte do Estado e da soberania nacional é parte de um projeto da necropolítica em curso no Brasil que fragiliza ainda mais aquelas e aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade. Por isso temos como papel fundamental, enquanto sociedade e principalmente enquanto mulheres (as mais afetadas) nos organizarmos em movimentos sociais, mobilizando e dialogando com a classe trabalhadora com o objeto de derrotar o projeto de morte em curso e derrubar o governo Bolsonaro o quanto antes.

Zezé Furtado é secretária de Mulheres do Sindicato dos Bancários de Brasília


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