Por José Ricardo Sasseron e Marcel Barros
O mercado financeiro não quer nem ouvir falar da participação dos trabalhadores na gestão dos fundos de pensão. Quer ter a liberdade de aplicar os recursos segundo seus próprios interesses e impedir qualquer ingerência por parte de quem investe o dinheiro na elaboração dos planos de previdência e da aposentadoria.
O mercado financeiro fez uma pressão enorme para aprovar a capitalização da previdência pública na reforma da Previdência de Bolsonaro e Guedes. Felizmente, os protestos dos trabalhadores e da sociedade evitaram essa tragédia sem precedentes. A gestão de trilhões de reais de poupança previdenciária daria aos bancos lucros exorbitantes, mas condenaria milhões de brasileiros a morrer sem aposentadoria por não terem, durante a vida laboral, recursos suficientes para fazer sua poupança previdenciária. E mais, isentariam as empresas do compromisso de contribuir para a aposentadoria de seus empregados.
Mercado financeiro
No entanto, a pressão do mercado financeiro sobre o governo e sobre o Congresso Nacional vai produzindo seus resultados, ainda que mais modestos: os bancos conseguiram incluir, na Reforma, a possibilidade de administrar a previdência complementar dos servidores públicos. Os servidores públicos têm média salarial superior à da iniciativa privada e têm estabilidade no emprego, requisitos essenciais para construir os mais portentosos fundos de pensão, assim como acontece nos países mais avançados. Apenas para ilustrar, em apenas sete anos de existência, a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp) atingiu o patrimônio de R$ 3 bilhões e 97 mil associados. Os banqueiros querem engordar seus lucros cobrando taxas de administração elevadas para gerir centenas de bilhões de reais dos servidores.
O próximo passo será desgastar a imagem dos fundos de pensão, com objetivo de demonstrar que a gestão do dinheiro deve ficar com os especialistas do mercado financeiro. Desgaste que se tenta fazer há muito tempo, diga-se de passagem.
Gestão do patrimônio
O que ganham os trabalhadores ao participar da gestão de seu patrimônio? Podem ter maior retorno sobre seus investimentos, economizar com as taxas de administração e interferir no tipo e qualidade de benefícios de aposentadoria, por exemplo.
Estudos feitos em vários países mostram que o mercado financeiro abocanha quase 40% de toda a poupança que o trabalhador acumula ao longo de sua vida laboral. Os fundos de pensão fechados, como Previ, Petros, Funcef, Valia e outros fazem a gestão com custos muito menores, pois não objetivam lucro, mas o bem estar dos participantes.
Experiência positiva
Experiências como a da Previ demonstram que a gestão eficiente, cuidadosa e voltada para resultados geraram superávits consecutivos – durante sete anos, de 2006 a 2013, a centenária Previ gerou quase R$ 60 bilhões de excedentes, correspondentes a 30% do patrimônio do fundo de pensão. Grande parte foi destinada aos participantes. Assim, sob a gestão do mercado financeiro, muito provavelmente os excedentes se transformariam em lucro para o banco. Na previdência privada os recursos dos poupadores normalmente são aplicados em fundos de investimento geridos pelas próprias subsidiárias dos bancos, em evidente conflito de interesses e partilha de lucros.
Finalmente, aquele que nos parece ser o maior prejuízo. Nos fundos de pensão fechados, os direitos são previstos nos regulamentos dos planos de benefícios, regulamentos aprovados pelo Conselho Deliberativo da entidade, órgão de governança que, por força de lei, deve ter a participação de representantes eleitos pelos próprios donos do dinheiro.
Já na previdência aberta, os participantes não têm qualquer interferência na elaboração dos planos de previdência, que podem ser alterados por decisão do banco. Nos raros casos em que as empresas contribuem para a poupança previdenciária de seus empregados, podem alterar regras e deixar de contribuir a qualquer momento. Ao contrário dos fundos fechados, onde ao criar um plano para seus empregados, a empresa assume obrigações contratuais que são fiscalizadas pelos trabalhadores e pelo Estado.
A previdência complementar é um contrato de direito privado. Nos fundos de pensão fechados, os participantes têm a possibilidade de ser parte ativa neste contrato. Na previdência aberta, ficam à mercê dos bancos.
José Ricardo Sasseron e Marcel Barros são ex-diretores eleitos de Seguridade da Previ. Marcel é atual vice-presidente da Anapar, onde Sasseron já foi presidente.
(Artigo publicado originalmente no portal RBA)