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2 de Maio de 2017 às 07:33

Brasil tem dívida cultural com Belchior


Crédito: Reprodução

Por Paulo Moreira Leite

Brasil 247 - Em 1983, durante um depoimento de 50 minutos ao extinto Vox Populi, na TV Cultura, uma espectadora perguntou a Antonio Belchior qual a importância do sucesso profissional em sua vida. "Sucesso é brilhante, é bonito," disse, antes de acrescentar: "A publicidade de meu  nome interessa pouco. O que me interessa é a glória, o reconhecimento de ter feito uma coisa que, como artista e como cidadão, julguei significativa de fazer."

Morto neste domingo, aos 70 anos de idade, a existência reclusa de Belchior nos últimos anos de vida  alimentou sérias dúvidas sobre a permanência de seu nome como garantia de vendas num mercado musical cada vez mais dominado por esquemas comerciais pesados. Não há dúvida, porém, de que alcançou a glória – no sentido mais nobre que essa palavra possui – como demonstram as homenagens recebidas, muito além da hipocrisia quase sempre obrigatória nessas ocasiões.

A cultura brasileira tem uma dívida imensa com a coerência de Belchior e sua capacidade para apresentar as próprias ideias de forma atraente e compreensível. Era porta-voz de um pensamento relativamente raro no país – libertário no sentido anarquista da palavra, de rejeição radical a toda forma de opressão e resistência a todo tipo de autoridade, mesmo consentida. Na música "Como o Diabo Gosta" chegou a escrever ("Nunca fazer o que o Mestre mandar, sempre desobedecer") afirmando uma noção que iria repetir outras vezes.

Poeta que empregava a música como um suporte para versos que sempre foram a prioridade assumida de suas canções, construiu uma obra sofisticada e literariamente complexa. Engajado em diversas campanhas democráticas, mantinha o equilíbrio. Sem nunca ter sido panfletário, jamais escondeu uma escolha política clara entre as opções enfrentadas pela história do país ao longo dos últimos 50 anos, condição que foi bem traduzida por pichações surgidas nos muros de grandes cidades brasileiras após sua morte:  "Fora Temer. Fica Belchior."

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Fonte: O jornalista e escritor Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília


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