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28 de Maio de 2020 às 17:43

‘Sleeping Giants ambiental’ expõe marcas atreladas a manifesto em favor de Ricardo Salles


El País Brasil
Breiller Pires

Diante do vendaval causado no meio corporativo pela chegada do Sleeping Giants ao Brasil, perfil que denuncia nas redes sociais empresas que anunciam em sites de extrema direita e notícias falsas, a estratégia de expor marcas e empresas nas redes sociais começa a ganhar corpo em outras frentes. Nesta terça-feira, organizações ambientais lançaram o movimento “Nome aos bois”, a fim de identificar companhias que, indiretamente, endossam um manifesto contra a “burocracia que devasta o meio ambiente”. O documento, publicado em anúncio de jornal, foi feito em apoio às ações do Ministério do Meio Ambiente, após a divulgação do vídeo de uma reunião em que o ministro Ricardo Salles diz ao presidente Jair Bolsonaro que o Governo deve aproveitar a “oportunidade” da pandemia para avançar a pauta de desregulamentação do setor. Ou, em suas palavras, “ir passando a boiada e simplificando normas [ambientais] (...) de baciada”. O manifesto é assinado por associações comerciais que representam mais de 70 empresas.

Com reprodução de tática semelhante à do Sleeping Giants, perfis como o do Greenpeace BrasilObservatório do Clima e ClimaInfo publicaram no Twitter o nome das empresas vinculadas às associações que assinam o manifesto pró-Salles, veiculado em anúncio da Folha de S. Paulo, utilizando as hashtags #NomeAosBois e #essaboiadanãovaipassar. Entre as marcas expostas estão BRF, Batavo, Friboi, Qualy, Marfrig, Pedigree, Royal Canin, Sadia, Turma da Mônica e Whiskas, representadas pela Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Associação Brasileira de Reciclagem Animal (ABRA) e Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), além de Avon, Natura e O Boticário, que fazem parte da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC).

Em menos de 24 horas da campanha, algumas entidades e empresas se manifestaram depois do alerta nas redes sociais. “Em conjunto com a Natura, repudiamos esta declaração de apoio [ao Ministério do Meio Ambiente]. Não aprovamos ou sequer fomos consultadas sobre este anúncio. É extremamente necessário manter o respeito à legislação e reforçar os instrumentos de fiscalização ambiental diante do atual cenário”, respondeu a Avon, marca do Grupo Natura, expressando discordância com o apoio às medidas de desregulamentação propostas por Salles. Já o Grupo Boticário informou que “não apoia qualquer ação que desestimule a preservação do meio ambiente, o desenvolvimento sustentável ou que desrespeite o marco legal do país. Acreditamos que contribuir com o futuro é parte importante dos compromissos que o setor privado deve assumir”, sem especificar, entretanto, se endossou o manifesto assinado pela ABIHPEC.

Por meio da Mauricio de Sousa Produções, a Turma da Mônica, que foi exposta por ter uma linha de 14 produtos licenciados em parceria com a Seara —a empresa do grupo JBS é associada à ABRA—, afirmou que “não foi consultada sobre o anúncio em questão nem o subscreve. Nossos 60 anos de história demonstram nosso compromisso com a proteção da natureza”. O Greenpeace celebrou o comunicado que desautoriza a ABRA como representante da marca. “Ao que parece, eles [associação] esqueceram de consultar suas filiadas sobre o anúncio de apoio ao Salles”, escreveu a ONG.

Redes hoteleiras também são cobradas pelas organizações ambientais, já que a Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (ADIT) é uma das signatárias do manifesto. “O Txai esclarece que, embora façamos parte da ADIT Brasil, que em seu nome divulgou o anúncio, não aprovamos nem tampouco fomos consultados em relação ao apoio anunciado. Qualquer conduta ou decisão que possa prejudicar o meio ambiente não condiz com os nossos valores de respeito e conexão que temos com a natureza”, afirma a rede de resorts instalada em Itacaré, na Bahia. Da mesma forma, o Beach Park, de Fortaleza, no Ceará, comunica não ter sido informado pela ADIT sobre a ação. Por isso, solicitou sua desfiliação imediata da entidade. “Estamos juntos com todos que defendem o meio ambiente.”

Em nota, a ADIT considerou injusta a exposição de empresas pelos perfis ativistas, por entender que a prática rotula companhias como inimigas do meio ambiente. “O manifesto endossado pela ADIT Brasil junto a diversas outras entidades do mercado imobiliário não defende o desmatamento, muito menos a destruição da Amazônia”, argumenta a associação. “Por outro lado, o manifesto veiculado condena a burocratização que se utiliza de uma falsa bandeira ecológica para o travamento das atividades econômicas.”

No último domingo, um grupo de organizações ambientais, encabeçado por Greenpeace e WWF Brasil, já havia publicado anúncio de uma campanha criticando Salles. “Para o ministro do Meio Ambiente, mais de 20.000 mortos são uma oportunidade”, dizia a peça, em referência à fala na reunião ministerial, ocorrida em 22 de abril, sugerindo pressa ao Governo no afrouxamento de regras ambientais. A repercussão da estratégia declarada de usar a pandemia como pano de fundo para ações na pasta aumentou a pressão pela queda do ministro. Nesta quarta-feira, o Ministério Público Federal (MPF) pediu a abertura de investigação contra Salles por possível crime de responsabilidade. De acordo com o órgão, o vídeo da reunião demonstra “clara intenção de promover a desregulamentação do Direito Ambiental pátrio”, contrariando deveres do cargo.

Em dezembro de 2018, quando ainda não havia tomado posse como ministro, Ricardo Salles foi condenado em primeira instância por improbidade administrativa no exercício do cargo de secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, no governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Acusado de fraude e adulteração de mapas de zoneamento do plano de manejo para a Área de Proteção Ambiental do Rio Tietê, ele recorre da decisão proferida pela Justiça paulista.

 

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