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24 de Novembro de 2017 às 16:37

Seminário internacional sobre reformas trabalhistas aponta os novos desafios do movimento sindical

Debate com especialistas do Brasil, Espanha, Itália, México, Argentina, Portugal e Peru sugere que sindicatos precisam repensar sua ação para enfrentar a nova legislação


Crédito: Reprodução

A reforma trabalhista imposta pelo ilegítimo governo Temer para atender a demanda do empresariado que bancou o golpe de 2016 é semelhante às reformas implementadas em vários países da Europa e das Américas e faz parte da ofensiva neoliberal em todo o planeta para reduzir direitos dos trabalhadores e ampliar o ganho do capital. Isso aumenta os desafios do movimento sindical, que se torna ainda mais necessário para defender a classe trabalhadora, mas precisa repensar sua atuação para fortalecer a representação dos trabalhadores e fazer com mais eficiência a luta de classes.

Essas foram, em síntese, as principais conclusões do II Seminário Internacional Reforma Trabalhista – Crise, Desmonte e Resistência, realizado em São Paulo nesta quinta e sexta-feira 23 e 24 de novembro, em São Paulo, pelo Instituto Lavoro, com apoio do escritório LBS e participação de especialistas do Brasil, Espanha, Argentina, Itália, México, Portugal e Peru. Vários dirigentes da Federação dos Bancários do Centro Norte (Fetec-CUT/CN) e dos sindicatos filiados participaram do seminário.

“As experiências trazidas pelos especialistas estrangeiros, principalmente da América Latina e Europa, nos mostra uma fotografia do que deve acontecer com as relações de trabalho no Brasil. Diante disso, nos resta a opção de nos esforços para termos uma linha de atuação de forma a superar as dificuldades apresentadas nos outros países”, afirma Cleiton dos Santos, presidente da Fetec-CUT/CN, que participou do seminário. 

“Mais uma vez a LBS, que assessora a Fetec Centro Norte, faz um excelente seminário sobre a reforma trabalhista, desta vez com especialistas de vários países. Eles trouxeram as experiências de reformas nos seus países, nos mostraram o quanto elas foram prejudiciais aos trabalhadores, mas ficaram assustados com o que está acontecendo aqui”, diz José Avelino, secretário de Assuntos Jurídicos da Fetec-CUT/CN.

“O seminário todo foi muito bom. Um dos aspectos que mais me chamou a atenção foi a provocação colocada, no sentido positivo, de que o fim do imposto sindical forçará o movimento sindical a discutir pra valer a fusão de sindicatos e buscar a ação unitária para defender a classe trabalhadora”, acrescenta Eduardo Araújo, presidente do Sindicato de Brasília.

Reforma de Temer é pior que dos outros países

O advogado José Eymard Loguércio, da LBS, explica que este II Seminário Internacional dá continuidade ao primeiro, realizado no ano passado para conhecer os efeitos das reformas implementadas principalmente na Espanha, Itália, México e Peru, diante da previsão já naquela época de que o governo Temer imporia retrocessos aos direitos dos trabalhadores. “Só não sabíamos que seria com essa velocidade e truculência com que ocorreu”, diz Eymard.

A reforma trabalhista de Temer, na avaliação do assessor jurídico da Fetec-CUT/CN, “pega quase que um pouquinho do que á de ruim de cada uma e faz um pacote de maldades que, além de não ter capacidade gerar de emprego, se gerar não será emprego de qualidade. Serão empregos de pior qualidade do que os que foram gerados nos últimos 10 anos com políticas sociais”.

Nesse sentido, a nova legislação que entrou em vigor dia 11 de novembro, acrescenta Eymard, é pior que as desses outros países “porque mistura duas questões. Do ponto de vista dos direitos individuais, retira direitos clássicos, e do lado do direito coletivo ela também estabelece uma depreciação da ação sindical que deixará os trabalhadores ainda mais precarizados. Então, essa combinação de fatores transforma a reforma trabalhista brasileira pior que as dos outros países”.

Para Eymard, “o seminário foi muito bom pela reflexão que traz, pela qualidade dos participantes que conseguiu reunir e pela possibilidade de diálogo com o movimento sindical, uma vez que participaram importantes dirigentes sindicais com atuação nacional e internacional, e todos eles com o propósito de fazer essa reflexão e ver como isso se aplica, além da necessidade de o movimento sindical repensar sua prática e sua ação. Esse é um desafio que está colocado para o movimento sindical hoje”.

As reformas no mundo

Na quinta-feira 23, primeiro dia do seminário, os convidados internacionais fizeram apresentação sobre as reformas trabalhistas ocorridas no Peru, México, Espanha, Itália e Portugal. O que se vê pelo mundo é um “caminho” muito parecido que ignora fronteiras e é marcado pelo enfraquecimento dos movimentos sindicais, pelo ataque à Justiça do Trabalho e ao direito trabalhista. Elementos que, somados a uma inevitável ampliação da terceirização, levam à precarização não só do trabalho, mas especialmente da vida dos trabalhadores, ampliando a desigualdade social. 

“A terceirização e subcontratação estão crescendo com um câncer nas relações de trabalho. No mundo todo, o desenvolvimento da precarização é espantoso”, alerta o advogado mexicano Oscar Alzaga (Sindicato Mineiro do México). Seu país tem hoje um dos salários-mínimos mais baixos do mundo, com o pagamento de US$ 4 dólares (cerca de 12 reais)  por oito horas diárias de trabalho. 

Alzaga esteve neste dia 23 de novembro participando da mesa de abertura do II Seminário Internacional do Instituto Lavoro “Reforma Trabalhista: Crise, Desmonte e Resistências – Experiências Internacionais”, que segue nesta sexta, no centro de convenções do Hotel Pulmann Vila Olímpia, em São Paulo. 

Ao seu lado, participaram também como palestrantes os professores Guillermo Boza (PUC Peru), Francisco Trillo (da Espanha) e João Amado Leal (Portugal), além do advogado italiano Gianni Arrigo (Universidade de Bari); do jurista brasileiro e professor da PUC Minas, Márcio Túlio Vianna e do sindicalista Arthur Henrique da Silva Santos (Fundação Perseu Abramo).

O debate apresentado foi construído por meio do compartilhamento de experiências já vividas pelos outros países e que hoje estão próximas de tornarem-se realidades no Brasil.

Desigualdade Social

A Espanha, citada como exemplo pelo governo Temer no discurso que buscava aprovação da Reforma Trabalhista, enfrenta hoje sérios problemas. O professor da Universidade de Castilha-La Mancha, Francisco Trillo, acredita que a mais agravante consequência de sucessivas reformas em seu País, a última delas, em 2012, é o aumento da desigualdade. “Não só como consequência do desemprego, mas também como resultado do trabalho precário, onde temos trabalhadores que, mesmo tendo emprego, estão abaixo da linha da pobreza”, disse.

Segundo Trillo, quase 80% dos novos contratos de trabalho são temporários, atingindo principalmente os jovens, em começo de carreira. O número de mortes de trabalhadores aumentou 20% nos últimos anos.  “As últimas reformas aplicadas no meu país tentaram prender o trabalho como um fato privado na relação entre trabalhadores e empregadores, mas o trabalho é fenômeno social que vai muito além de um acordo, não podemos permitir que a flexibilização apenas retire o trabalhador da condição de assalariado para lançá-lo a figura de autônomo, vestido sobre a roupa do empreenderismo, quando na verdade, só o que querem é esconder o fracasso do empresariado.”

“O México tem o governo neoliberal com mais tempo de permanência no poder, desde 1983. O que eu vejo é um retrocesso brutal no País, taxa de crescimento do PIB que antes era de 6% está a 2% - nos últimos 34 anos. Vivemos um golpe na liberdade sindical, temos presidentes de sindicatos exilados em outros países e um governo que até mesmo nega a existência de greves quando elas estão ocorrendo. Tínhamos um estado forte, uma indústria importante e hoje está tudo privatizado, até mesmo as praias. O emprego precário é a maior parte no meu País com quase 80% da população ganhando até 3 salários mínimos”, diz Alzaga.

Peru

A realidade no Peru não é muito diferente, segundo o professor da PUC Peru, Guillermo Boza. “O fantasma da flexibilização sempre esteve presente nas relações de trabalho, porém no Peru, ganhou mais força nos últimos 15 anos com o argumento de que seria fundamental para o crescimento econômico permanente. É uma ideia contraditária porque apesar de um certo crescimento econômico não se conseguiu os benefícios que suspostamente se esperava ter. Não gerou mais emprego e o número de informais aumentou muito, chegando a quase 70%. Temos uma lei trabalhista que estabelece a contratação por tempo indeterminado, mas que favorece o contrato temporário.  

A porcentagem de contratos temporários no Peru em relação aos permanentes aumentou de 25%, na década de 1990, para 75%, em 2016. E a renovação desses empregos temporários depende da não filiação sindical, o que causou uma intensa desmobilização da organização dos trabalhadores.  Em 1990, quando a crise começa, a filiação sindical era alta comparada com os outros países, era de 14% no Peru e 22% na capital, Lima, onde a maioria das empresas. Em 1990 havia 2000 contratos coletivos e foram registradas 700 greves nacionais. Dez anos depois, a filiação sindical caiu para 2,8%, ou seja, caiu 1000 %, no país e foi reduzida a 7% em Lima. O número de contratos coletivos caiu para 500 e apenas 100 greves foram organizadas.”

Problema é principalmente social

Segundo o professor João Leal Amado, da Universidade de Coimbra, Portugal começa a caminhar no sentido inverso. “Depois de um governo de direita que aplicou as políticas do neoliberalismo, há dois entramos em um novo ciclo político, que abre esperança, para uma  revalorização do trabalho. É uma ilusão achar que o desmonte de direitos é saída, pelo contrário”, acredita. 

Na opinião do prof. Márcio Túlio Viana, a mudança nos paradigmas do direito do trabalho está relacionada também a mudança no comportamento social. “A sede de liberdade aumentou muito e com isso a regra, e o direito só por ser regra, entra em crise. Não queremos nada rígido em nossas vidas e o direito do trabalho parece desabar sobre as cabeças das pessoas porque ele quer regras, ele quer projetos futuros, quer unir objetivos, algo na contramão de uma política na qua o coletivo perde espaço para o individual.”, avalia Vianna.

Para ele a Reforma Trabalhista seduz os trabalhadores com “disfarces” como a figura do  autônomo, que não percebe não ser empregado. “Na verdade é uma fraude que até mesmo o legislador sabe disso, ele faz a lei esperando  que as empresas comecem a transformar os empregados em autônomos, reduzindo direitos". 

Fetec-CUT/CN, com LBS Advogados

 

 


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