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15 de Janeiro de 2019 às 08:06

ARTIGO DA LBS: O fim da política de valorização do salário-mínimo – crônica de uma morte anunciada


Crédito: Reprodução

Por Luciana Lucena Baptista Barretto, Daniela Costa Gerelli e Aline Carla Lopes Belloti

O Decreto nº 9.661, de 1º de janeiro de 2019, determinou o reajuste do salário-mínimo para R$ 998,00, valor abaixo do aprovado em votação orçamentária pelo Congresso Nacional em dezembro de 2018, fixado em R$ 1.006,00 para o exercício financeiro de 2019. 

A justificativa apresentada pela equipe econômica para a redução em R$ 8,00 (oito reais) é de que o reajuste tem grande impacto nas despesas da União, já que há vinculação entre a atualização do salário-mínimo e a correção de benefícios previdenciários. A valorização do salário-mínimo, no entanto, para além de influenciar os gastos federais, repercute na economia com injeção de recursos para o consumo. 

Afinal, o valor nominal do salário-mínimo representa o valor real da remuneração da maioria dos trabalhadores brasileiros com registro formal. E, ainda, tem um “efeito farol” sobre os valores recebidos pelos trabalhadores informais, como constata o pesquisador Paulo Renato Costa Souza [1]: “no Brasil, entre 1950 e 1970, a taxa de salários paga na base do trabalho industrial constituía um “farol” para rendas do trabalho precário”. Nesse sentido, o salário-mínimo é o principal “norte” para as remunerações, sejam elas formais ou informais [2], afetando o poder de compra de toda a sociedade brasileira e, portanto, a demanda e a produção nacionais. 

Vale lembrar que o salário-mínimo foi criado por Getúlio Vargas, por meio da Lei nº 185, de 14 de janeiro de 1936, com o objetivo de garantir o mínimo existencial às pessoas que trabalham: “Todo trabalhador tem direito, em pagamento do serviço prestado, num salário mínimo capaz de satisfazer, em determinada região do país e em determinada época, das suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte” (artigo 1º).

Nesse sentido, o DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – divulga a cada mês uma estimativa do valor monetário para atender as necessidades mais básicas de um trabalhador e sua família, levando em consideração os fatores elencados na Constituição federal, como alimentação, moradia, educação, lazer, saúde, higiene, vestuário, previdência social e transporte. Em novembro de 2018, o valor considerado como o mínimo necessário foi de R$ 3.959,98 (três mil, novecentos e cinquenta e nove reais e noventa e oito centavos) para uma família com quatro pessoas [3]. 

Além disso, para que a economia do país possa crescer, é necessário que o trabalhador e os beneficiários da Previdência Social possam “consumir de fato”, além de sobreviver. Pelos dados acima indicados, o valor do atual salário-mínimo é insuficiente para a sobrevivência digna de qualquer brasileiro, sejam eles trabalhadores ou beneficiários da Previdência. 

Análise publicada pelo Professor Carlos Aguiar de Medeiros [4] aponta que “o crescimento do salário-mínimo nos últimos anos esteve entre um dos principais fatores que levaram ao maior crescimento da economia brasileira observado na segunda metade desta última década, sendo que tal crescimento possui entre outros aspectos a evolução da demanda dos padrões de consumo dos brasileiros que se tornaram mais intensivos em serviços, resultando em aumento da ocupação e consequente declínio no desemprego”. 

Logo, o que se observa é que o aumento que ocorrera especialmente na última década influenciou diretamente o poder de consumo das famílias e, consequentemente, a necessidade do aumento de produção, que gera novos empregos e faz com que menos pessoas dependam de medidas assistenciais do governo. E não só isso: com o aumento do salário-mínimo, cresce também a arrecadação das contribuições previdenciárias dos trabalhadores com registro formal de emprego. 

O reajuste abaixo do esperado representa retrocesso na política de valorização do salário-mínimo e movimento oposto à recuperação da economia nacional, já que, com menos recursos, consome-se menos, produz-se menos e não se geram tantos postos de trabalho. Assim, a decisão política de priorizar a austeridade fiscal sobre a de distribuição de renda tende a agravar a crise econômica, implicando menos consumo, menos emprego e, provavelmente, mais brasileiros dependentes de medidas assistenciais, que resultarão em gastos do governo federal. 

Moral da história: o Brasil não será um país governado para todos, mas isso já antevíamos durante a campanha eleitoral. 

 

Luciana Lucena Baptista Barretto, Daniela Costa Gerelli e Aline Carla Lopes Belloti são sócias de LBS Advogados, que presta assessoria ao Sindicato.

 

[1] SOUZA, Paulo Renato Costa. Salário e emprego em economias atrasadas. Campinas: Unicamp. Instituto de Economia, 1999.

[2] Dados do IBGE sobre o aumento da informalidade disponíveis no endereço eletrônico a seguir: <http://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2018/12/05/ibge-trabalhadores-informalidade-brasil-2017.htm>. Acesso em 08/01/2019.

[3] Disponível em: https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/salarioMinimo.html. Acesso em 08/01/2019.

[4] MEDEIROS, Carlos Aguiar de. A influência do salário mínimo sobre a taxa de salários no Brasil na última década, In: Economia e Sociedade, Campinas, v. 24, n. 2 (54), p. 263-292, ago. 2015. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/1982-3533.2015v24n2art2>. Acesso em 07/01/2019.


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