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1 de Junho de 2017 às 10:36

A Nova Rota da Seda no mundo do século 21


Pepe Escobar
do Asia Times, de Hong Kong, via Carta Maior

Antes de tudo, vamos esquecer qualquer ideia de perseguição. A nova iniciativa da China, A Nova Rota da Seda, é o único projeto de desenvolvimento multilateral de grande escala que o século XXI viu até agora.
 
Não há contra-oferta do Ocidente.
 
É por isso que o Fórum Belt and Road para a Cooperação Internacional, com duração de dois dias, que se iniciou no domingo último, em Pequim, está sendo apresentado como uma possibilidade real de alterar o jogo da economia global. Aqui, a iniciativa parece que mudou para o modo Mark II – 2.0 -, acelerando o que o presidente Xi Jinping apelidou, em Davos, em janeiro, de "globalização inclusiva".
 
As grandes ideias por trás desse grande plano chinês, no entanto, ainda estão se perdendo em tradução. Inicialmente, esta via expressa trans-asiática foi anunciada como One Belt, One Road (OBOR), uma tradução literal do chinês yi dai yi lu . Agora, é a Iniciativa de Cinturão e Estrada (BRI), mas que ainda não vai até o Ocidente, mesmo que a China tenha tentado adicionar um pouco de soft power nela, na tentativa de ‘vender’ o Belt and Road para crianças de língua inglesa.
 
Eu fiz a cobertura dessa nova estrada da seda desde que ela foi anunciada pela primeira vez, em 2013. A ideia começou no Ministério do Comércio e depois se desenvolveu como uma extensão natural da campanha Go West - focada no desenvolvimento da província ocidental de Xinjiang - lançada em 1999. O Ministério do Comércio agora reitera que a OBOR/BRI é um plano global e não apenas ligado à presidência Xi Jinping.
 
A cúpula de Pequim tenta retratar como o seu ambicioso conceito de comércio livre se tornou uma visão compartilhada "win-win" multilateral que conecta toda a Eurásia. Ou, para colocá-lo de forma mais simples, globalização Mark II. Ou 2.0.
 
É esclarecedor examinar os pronunciamentos feitos por alguns dos principais analistas da China. Wang Huiyao, presidente do Centro Independente para a China e Globalização, diz que este é o "novo motor da globalização".
 
Shen Digli, do Instituto de Estudos Internacionais da Universidade Fudan de Shangai, enfatiza uma "iniciativa de interconectividade em escala global".
 
Wang Yiwei, do Centro de Estudos Europeus da Universidade Renmin, está convencido de que isso poderia ser tão importante quanto a criação da União Europeia.
 
E Shinhin Yinhong, do Centro de Estudos Americanos da Universidade Renmin, aponta que o OBOR/BRI, diz que ele não funcionaria se fosse apenas uma aposta geopolítica.
 
Isso vai atuar como um impulso para as economias como a de Bangladesh, para o Egito,  Mianmar e Tajiquistão; é também um plano de grande alcance de economia, do comércio livre e do investimento que irá abrir mercados para a tecnologia chinesa e suas mercadorias. E com isso vem o inestimável alcance geopolítico para a China.

Paralelamente a esta surpreendente conectividade, que pode abranger 65 nações, 60% da população mundial e um terço da produção econômica global, a China acumulará capital extra da Ásia Central para o Oriente Médio. Ela também vai consolidar seu status como líder do mundo em desenvolvimento, permitindo-lhe uma vez mais tentar e relançar o  movimento de 120 nações não-alinhados (NAM).
 
Representantes de mais de uma centena de nações convergiram para Pequim e a maioria deles serão, no futuro, do NAM. É claro que teremos Vladimir Putin, representante da parceria estratégica Rússia-China (BRICS, SCO), que abrange tudo, desde energia até projetos de infra-estrutura (incluindo o futuro trem de alta velocidade transiberiano).  Mas, e isto é crucial, tivemos o primeiro-ministro paquistanês Nawaz Sharif e o presidente turco, Recep Tayyip Erdo%u01Fan, líderes de dois centros-chave do OBOR/ BRI.
 
A maioria dos países do Ocidente ainda precisa de um meteorologista para ver em que direção o vento está soprando. E muitos meios de comunicação ocidentais gostam de rejeitar a OBOR/BRI tratando-a como uma conspiração, um "esquema" ou uma tentativa chinesa de "cercar" a Eurásia.
 
Apenas um líder do G7 esteve em Pequim - o primeiro-ministro italiano, Paolo Gentiloni, muito empenhado em investigar as ligações simbióticas entre o programa da indústria italiana 4.0 e a iniciativa madeireira China Made in China/2025.
 
Angela Merkel pode ter recusado o convite para a cúpula; mas não importa, porque os industriais alemães estão todos com o OBOR/BRI.
 
E a administração Trump está começando a despertar para a próxima ação: Trump-Xi em Mar-A-Lago. A delegação dos EUA liderada por Matt Pottinger, Assistente Especial do Presidente e diretor sênior para o Leste Asiático no Conselho de Segurança Nacional.
 
E a Índia? O Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC), um dos destaques do OBOR/BRI, entusiasticamente elogiado por funcionários paquistaneses, se estende, em parte, através da Caxemira. A diplomacia, e não o comércio, melhoraria os interesses indianos.
 
Mas a realidade é o governo Narendra Modi, que tem acusado a China de tentar "minar a soberania de outras nações". Ele é obcecado pelo fato de que a agenda chinesa real é controlar estrategicamente o Oceano Índico. Portanto, nenhuma Índia em Pequim.
 
A Nova Rota da Seda vem com um fogo cruzado de números. Ninguém sabe com certeza o verdadeiro valor de projetos já assinados ao longo do cinturão terrestre e através da Rota da Seda Marítima, mas já se diz que já chegam a US $ 300 bilhões. A maioria desses projetos será desenvolvida até a próxima década.
 
A agência de rating Fitch cita US$ 900 bilhões em projetos planejados ou já em curso. De acordo com o Banco Asiático de Desenvolvimento (BAD), a Ásia precisará de US$ 26 trilhões para projetos de infra-estrutura até 2030. A expectativa é de que o OBOR/BRI possa precisar de US$ 5 trilhões até 2022.
 
O Fundo Silk Road, criado no final de 2014, conta, por enquanto, com apenas US$ 40 bilhões - um mix de reservas cambiais e entrada do Banco de Desenvolvimento da China e do Banco de Exportação e Importação da China que investiu US $ 6 bilhões em 15 projetos até agora, mais US$ 2 bilhões para financiar projetos no Cazaquistão.
 
O Banco Asiático de Investimento em Infra-estrutura (AIIB), com 70 países-membros, entrou em operação em janeiro de 2016 com capital de US$ 100 bilhões, mas desembolsou menos de US $ 2 bilhões no ano passado.
 
O Banco de Desenvolvimento (NDB), o banco BRICS, será obrigado a acelerar em breve, depois que obteve uma classificação AAA de agências de crédito chinesas.
 
A China pertence ao Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD) desde 2015. Esta é a etapa financeira europeia para o OBOR/BRI, também está ligado a um fundo no Luxemburgo e a outro em Riga, na Letônia.
 
Assim, a questão-chave para o OBOR/BRI continua a sendo a forma de criar um financiamento de baixo custo nos mercados globais de capitais. Esse foi um tema de discussão na cúpula.  
 
Zhou Xiaochun, governador do Banco Popular da China, já estabeleceu a lei: governos - incluindo o governo chinês - simplesmente não podem pagar por tudo o que é necessário para OBOR/ BRI.
 
Assim, todos terão que correr para os mercados de capitais, criarem os seus próprios mecanismos financeiros relacionados com o OBOR/BRI, e, especialmente, fazer negócios em moedas locais. O que é uma abreviatura para usar, acima de tudo, a moeda da China.
 
Então, se você está atacando as Novas Rotas da Seda, não se esqueça do yuan.


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